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CIP propõe referendo em Moçambique sobre eleições distritais

12 de abril de 2023

A comissão criada pelo Governo para avaliar a viabilidade das eleições distritais de 2024 em Moçambique não tem tempo nem "legitimidade" para fazê-lo, considera o CIP, que defende a realização de uma consulta popular.

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Foto: Getty Images/AFP/G. Guercia

Em entrevista à DW África, o investigador Ivan Maússe, do Centro de Integridade Pública (CIP), critica o facto de a comissão criada pelo Parlamento na semana passada, em Maputo, ser composta apenas por membros do partido no poder, e defende a realização de um referendo para trazer à tona a vontade dos cidadãos.

A não realização das eleições distritais, como previsto na Constituição, poderá colocar em causa o processo de paz em Moçambique, lembra ainda Ivan Maússe. O investigador do CIP defende que a sociedade civil deve envolver-se no debate sobre a descentralização distrital, porque este é um mecanismo que vai "devolver o poder ao povo".

DW África: Que críticas faz o CIP à comissão criada pelo Governo para avaliar a viabilidade das eleições distritais?

Ivan Maússe (IM): Em primeiro lugar, é importante entender que a consagração das eleições distritais para 2024 foi feita por meio da revisão constitucional de 2018. Neste caso, a partir do momento em que as eleições distritais estão marcadas por meio da Constituição da República, significa que todos nós temos de respeitar. Sendo assim, não pode o Governo aparecer agora a criar uma comissão que deve discutir sobre uma matéria com consagração condicional, sem envolver os demais atores da nossa sociedade. E se nos lembrarmos, a revisão constitucional que estabeleceu as eleições distritais de quatro é resultado dos consensos alcançados entre o Governo e a RENAMO. Logo, a ter que fundar ou criar uma comissão para refletir à volta da pertinência dessas eleições tem de envolver os partidos da oposição, a começar pela própria RENAMO o MDM, que têm assento parlamentar.

CIP propõe referendo em Moçambique sobre eleições distritais

A partir do momento em que já aparece na Constituição da República, significa que é um direito adquirido dos moçambicanos. Logo, os moçambicanos devem ser envolvidos na discussão sobre a pertinência ou não das eleições. E para poderem envolver os moçambicanos, seria necessário que esta matéria fosse sujeita a referendo. Infelizmente, em Moçambique não temos atualmente uma lei do referendo, mas a nossa Constituição já diz que quando se tratar de assuntos de relevância nacional, é importante que haja envolvimento dos moçambicanos. Nós notamos ainda que mesmo essa comissão, da maneira como foi criada, tendo em conta o tempo para o anúncio oficial das eleições por parte do chefe de Estado, que passou de 18 para 14 meses, que será por meados de agosto, duvidamos que possa trazer um resultado apurado à volta da pertinência ou não dessas eleições. Logo, para nós, é uma comissão que no fim do dia vai legitimar, vai confirmar a posição da FRELIMO, que foi várias vezes ecoada ao longo do ano passado.

DW África: Pode-se falar num "golpe" à democracia, como a própria oposição já classificou a criação desta comissão?

IM: Seguramente é um golpe à democracia, porque a democracia envolve o pluralismo de expressão e que todas as vozes devem ser ouvidas. Em se tratando uma matéria de interesse nacional, que é descentralização ao nível distrital, tem que haver envolvimento de todos os moçambicanos. E pelo tempo em que essa comissão é criada, é mesmo na verdade para poder atentar à democracia.

DW África: De que forma o eventual adiamento das distritais coloca em risco o processo de DDR dos ex-guerrilheiros da RENAMO?     

IM: Tratando se de uma situação de inviabilização dessas eleições, significa que pode vir a atrasar ainda mais o processo de DDR, porque uma das questões que fez com que a RENAMO fosse às matas mais uma vez nos últimos anos, foi pelo facto de entender que as eleições em Moçambique não eram justas e que a governação da FRELIMO não era de todo transparente e que a mesma estava sempre a colocar em causa a vitória da RENAMO em todas as eleições que o país foi registando. Num quadro como este, em que o processo de DDR está a ser negociado entre ambas as partes e não foi concluído, claramente vai atrasar e consequentemente o processo de paz ou pacificação do país vai ficar em causa.

DW África: Há alguma coisa que a sociedade civil possa fazer contra esta medida do Governo sobre as eleições distritais?

IM: O que nós podemos fazer em concreto é consciencializar e chamar os atores políticos para que possam sentar na mesma mesa e possam encontrar uma solução que seja consensual. Porque nós não podemos nos fiar apenas na perspetiva política, porque a descentralização a nível distrital não pode ser olhada como um mecanismo para poder permitir a divisão ou distribuição do poder entre os partidos políticos e satisfazer o governo da FRELIMO e a RENAMO. Não é isso. Temos que pensar na descentralização a nível distrital como um mecanismo de devolver o poder ao povo.

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Thiago Melo da Silva
Thiago Melo Jornalista da DW África em Bona