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Últimos ataques aumentam medo na Guiné-Bissau

24 de outubro de 2012

Especialista da Amnistia Internacional diz que situação de fragilidade pode levar a violações de direitos humanos. Comunidade internacional está "cansada" da instabilidade recorrente "porque não sabe a quem ajudar".

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Cotidiano após o golpe de Estado militar na Guiné-Bissau, em 12.04
Cotidiano após o golpe de Estado militar na Guiné-Bissau, em 12.04Foto: Reuters

Os parceiros internacionais da Guiné-Bissau manifestaram, nesta quarta-feira, "sérias preocupações relativamente aos acontecimentos de 21 e 22.10" no país e pediram às autoridades o respeito e a salvaguarda dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos, segundo diz uma nota assinada por Joseph Mutaboba, representante do secretário geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, em Bissau. A informação é da agência noticiosa LUSA e foi divulgada após encontro de Mutaboba com parceiros internacionais do país ocidental africano.

No domingo (21.10), um grupo supostamente comandado por um oficial guineense que tinha pedido asilo a Portugal tentou assaltar um quartel militar, uma ação da qual resultaram seis mortos, todos do grupo assaltante, segundo as autoridades do governo interino da Guiné-Bissau. Na segunda-feira (22.10), militares espancaram dois dirigentes partidários, abandonando-os depois em locais ermos nos arredores de Bissau.

Segundo Faustino Imbali, ministro dos Negócios Estrangeiros da transição guineense, o ataque à unidade de elite militar no domingo não foi uma revolta interna dos militares, mas sim uma revolta "de elementos estranhos às forças armadas".  

Antes, o governo também tinha anunciado que o ataque teria tido o envolvimento de pessoas oriundas da zona de Casamança, no norte da Guiné-Bissau, na fronteira com o Senegal, onde o grupo rebelde Movimento das Forças Democráticas de Casamança (MFDC), reivindica a independência do Senegal. Segundo Fernando Vaz, porta-voz do governo de transição, recrutar pessoas em Casamança "é muito fácil", posição que teve eco no Senegal.

A DW África entrevistou Marisé Castro, especialista em assuntos relacionados à Guiné-Bissau e à Guiné Equatorial em Londres, sobre a situação dos direitos humanos na Guiné-Bissau, país atualmente dirigido por um governo de transição, nomeado após um golpe de Estado militar ocorrido em 12.04. O golpe derrubou o então primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior e o presidente Raimundo Pereira, duas semanas antes da segunda volta do escrutínio presidencial no qual o primeiro-ministro era candidato.

DW África: Que avaliação faz da atual situação dos direitos humanos na Guiné-Bissau?

Marisé Castro:
Estamos muito preocupados porque, de fato, segundo as informações que estamos a receber, há uma situação de medo e insegurança generalizados entre a população após o ataque ao quartel dos para-comandos no último domingo (21.10) de madrugada. Ainda estamos a investigar e não temos todas as informações de que precisamos e há diversidade (sic) nas informações. Algumas pessoas estão a dizer que a situação é calma em Bissau [a capital].

Achamos que há um grau de verdade nisso, mas também há outras informações a dizer que, nos bairros onde estão os militares, [estes] estão a ir para os bairros à procura das pessoas que alegadamente estavam envolvidas no ataque. E a população nestes bairros está a ficar com muito medo, porque não sabem o que se pode passar se os militares encontrarem lá alguma pessoa suspeita de envolvimento no ataque.

DW África: Há muitos anos, a situação dos direitos humanos na Guiné-Bissau é preocupante. O que pode ser feito e o que está a ser feito para melhorar esta situação?

MC:
A situação é preocupante e é uma situação de fragilidade, embora, neste momento, haver uma situação que pode levar a mais violações. Primeiramente, nós pedimos às autoridades que assegurem que a população não seja molestada pelos militares, pela polícia, por ninguém – por nenhuma força de segurança. E eles precisam investigar e procurar as pessoas supostamente envolvidas no ataque.

Também têm de investigar os casos de espancamento de dois políticos – Iancuba Indjai [líder do Movimento Democrático Guineense (MDG)] e Silvestre Alves [líder do Partido da Solidariedade do Trabalho (PST)] – que foram apanhados por um grupo de pessoas que todas as pessoas estão a dizer que são militares, embora eles não tenham estado fardados, mas foram reconhecidos por pessoas que os identificaram como militares.
 
Estas pessoas [políticos] foram levadas para algum lugar e espancadas e estão a receber tratamento médico. Tem que haver uma investigação e estas violações por parte dos militares, ou quem quer que seja o responsável por estes espancamentos, têm que parar.

DW África: Ao contrário do que sucede noutros países, onde há um grande interesse internacional pelo que se passa lá, a Guiné-Bissau, talvez por ser um país pequeno, ou talvez pela comunidade internacional estar "cansada", não merece destaque ou atenção – mesmo das organizações não governamentais que trabalham com os direitos humanos. Considera esta avaliação correta?

MC: Não está totalmente correta. Acho que a comunidade internacional tem estado muito envolvida politicamente com a Guiné-Bissau. Mas o país sofre uma epidemia de golpes de Estado e acho que a comunidade internacional está a ficar um bocado cansada de tantos golpes e de tanta insegurança, porque esta situação de insegurança impede que a comunidade internacional possa ajudar, porque muitas vezes não sabe a quem está a ajudar.

Com respeito às organizações de defesa dos direitos humanos, não posso falar em nome de outras organizações, mas a Amnistia Internacional acompanha a situação dos direitos humanos na Guiné-Bissau há muitos anos. Há momentos em que não reagimos publicamente porque não é preciso, mas estamos a reagir de maneira privada. E quando é preciso reagir publicamente à situação, o temos feito.

Entrevista: Helena Ferro de Gouveia
Edição: Renate Krieger/António Rocha

24.10 AI Guiné-Bissau - MP3-Mono

Ataque de domingo levou à morte de seis pessoas, todas do grupo que tentou assaltar unidade de elite, disse o governo de transição
Ataque de domingo levou à morte de seis pessoas, todas do grupo que tentou assaltar unidade de elite, disse o governo de transiçãoFoto: DW
Nota do representante da ONU em Bissau, Joseph Mutaboba (foto), pediu "salvaguarda dos direitos fundamentais dos cidadãos"
Nota do representante da ONU em Bissau, Joseph Mutaboba (foto), pediu "salvaguarda dos direitos fundamentais dos cidadãos"Foto: DW
Quatro soldados presos após ataque a unidade militar de elite no domingo (21.10): governo de transição apontou suposto envolvimento de pessoas oriundas de Casamança
Quatro soldados presos após ataque a unidade militar de elite no domingo (21.10): governo de transição apontou suposto envolvimento de pessoas oriundas de CasamançaFoto: DW
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