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Tragédias no Mediterrâneo mudam rotina de Lampedusa

Angelo van Schaik / Theresa Krinninger (fc)20 de abril de 2015

Pescadores da ilha italiana, porta de entrada para refugiados vindos da África, relatam experiências traumáticas, incluindo o resgate de imigrantes em alto mar. Há ainda o medo dos traficantes, cada vez mais agressivos.

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Foto: picture-alliance/dpa/Italian Navy/Handout

Mais de 700 pessoas morreram afogadas entre a Líbia e a ilha italiana de Lampedusa somente no último fim de semana, estima o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur). Se confirmadas as mortes, o acidente eleva para mais de 1.500 o número das vítimas da travessia marítima entre a África e a Europa em 2015.

Há algumas semanas, a prefeita de Lampedusa, Giusi Nicolini, descreveu o clima na ilha. "Cada novo naufrágio é uma tragédia para nós. Sofremos junto", afirmou.

Até hoje, os moradores de Lampedusa lembram-se bem de um fatídico dia, há um ano e meio. Um deles é o pescador Constantino Baratta, cuja vida mudou após aquele 3 de outubro de 2013. "Vimos várias pessoas na água. Elas gritavam por socorro. Trouxemos uma a uma a bordo. Eram jovens, estavam nuas e sujas de diesel dos pés à cabeça", relata.

Então, Baratta encontrou uma menina, que ele inicialmente pensou estar morta. De repente, ela levantou os braços e gritou por socorro. O pescador mostra fotos do dia da tragédia – entre elas, a de uma mulher afogada, a 3 metros de profundidade.

Italien Flüchtlingsdrama vor Lampedusa Giusi Nicolini
Nicolini: não adianta construir muros e fechar fronteirasFoto: imago/Insidefoto

"Esta é Lwam, a última que salvamos", diz sobre outra foto. Lwan vem da Eritreia e é uma das poucas sobreviventes do naufrágio em 2013. Logo após o desastre, Baratta visitou a meninas e os outros 12 jovens que resgatou no campo de refugiados local. A maioria deles recebeu asilo político na Suécia, Noruega e Alemanha. Até hoje, ele e sua mulher mantêm contato diário com eles, por telefone ou por e-mail.

O dia da catástrofe foi um divisor de águas para a Itália. Depois da tragédia, o país criou a operação de resgate marítimo Mare Nostrum, com o objetivo de salvar o maior número de pessoas possível. Como parte do programa, a Marinha italiana e a guarda costeira realizavam patrulhas até a costa da Líbia.

Mas a operação ficou muito cara para os italianos e, por isso, foi repassada à Agência Europeia de Gestão das Fronteiras Externas (Frontex), que instaurou o programa Triton.

Guarda costeira italiana sobrecarregada

Salvatore di Grande, chefe da guarda costeira de Lampedusa, coordena cinco navios de resgate da missão Triton, que patrulham a costa italiana. Para ele, o número de navios não é suficiente.

"Mesmo quando as condições para a navegação são péssimas, há muitos traficantes de pessoas que forçam os refugiados a saírem para o mar", afirma. Ele diz que sua guarda costeira não tem condições de impedir novas catástrofes.

A constante confrontação com o destino dos refugiados e a presença de cada vez mais traficantes de pessoas na região também são um fardo para os pescadores de Lampedusa. Eles têm medo dos contrabandistas, por exemplo, que geralmente estão armados. Um pescador relata que "traficantes de pessoas ameaçaram com uma guarda costeira que fazia patrulha armas de fogo, porque queriam seus barcos de volta".

Nicolini destaca que a função da guarda costeira não é conduzir uma guerra. Mas os traficantes de pessoas estão se tornando cada vez mais agressivos, diz a prefeita. No entanto, ela aponta como o verdadeiro problema a instabilidade nos países de origem dos imigrantes, a qual sempre desencadeia novas ondas de refugiados.

UE sob pressão

No Parlamento italiano, a operação Mare Nostrum foi alvo de duras críticas por parte da oposição conservadora de direita, que classificou o programa de "um serviço de táxi com destino à Europa".

Lampedusa Triton Patrouillenschiff Viana do Castelo
Navio da missão Triton, que sucedeu a Mare NostrumFoto: DW/B. Riegert

A missão Triton tem recursos limitados, com orçamento mensal de 2,9 milhões de euros – um terço do que a Itália investia na Mare Nostrum.

A Organização Internacional de Migração (OIM) estima que mais de 3 mil pessoas tenham morrido no Mediterrâneo no ano passado. Somente nas última semana, centenas de refugiados morreram, forçando a União Europeia (UE) a estudar novas medidas.

Nicolini argumenta que erguer muros e fechar fronteiras não vai impedir que imigrantes fujam de seus países de origem e teria mais mortes como consequência.

Para o pescador Aurelio Palmesano, se os refugiados fossem levados diretamente para a terra firme na Itália, a tragédia chegaria ao fim – tanto para os habitantes de Lampedusa quanto para o resto do mundo.