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Serviço voluntário é tradição de quase 200 anos

Frederike Müller (md)18 de agosto de 2013

Sejam em obras de caridade, ONGs ambientalistas, agremiações políticas ou clubes esportivos de bairro, funcionários não remunerados são imprescindíveis em vários setores da sociedade alemã.

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Foto: picture-alliance/dpa

Uns trabalham como enfermeiros voluntários em organizações como a Cruz Vermelha alemã. Outros treinam jovens jogadores de futebol no clube esportivo da esquina. Trabalhadores voluntários são muito úteis à sociedade. Na Alemanha, cerca de 29 milhões de pessoas trabalham sem remuneração, o equivalente a mais de um terço da sociedade. A principal característica de um cargo honorário é que ele seja voluntário. Entretanto, nem sempre isso foi assim.

Raízes cristãs

Ajudar pobres tem uma longa tradição na Igreja Cristã. Mas foi limitada por muito tempo apenas a gestos de caridade isolados. O atendimento privado organizado para os pobres através de voluntários começou na Alemanha em 1788. O empresário de Hamburgo Caspar Voght fundou a Hamburger Armenanstalt, uma instituição dedicada à assistência aos pobres.

Nessa grande organização, havia cerca de 200 voluntários trabalhando, desde membros da administração pública e do legislativo da cidade, assim como médicos e professores, que prestavam serviços de assistência médica e econômica em vários bairros de Hamburgo. Esta participação privada tinha como meta complementar o bem-estar público. O sistema lançou as bases para o atual estado de bem-estar social da Alemanha.

Hamburg 18. Jahrhundert
Hamburgo no final do século 18Foto: picture-alliance/akg-images

Movimentos de emancipação

Quase simultaneamente, foi criado o cargo de político honorário. O exército de Napoleão havia derrotado a Prússia em 1806. O rei Frederico Guilherme 3º queria, através de reformas, voltar a estabilizar seu império reduzido e enfraquecido. Para poupar suas finanças, ele forçou cidadãos ricos a assumir cargos públicos sem remuneração nas administrações regionais. É quando o termo Ehrenamt ("cargo honorário") surge pela primeira vez na legislação prussiana, em 1808.

Com o florescimento das instituições privadas, começaram a ser formados em meados do século 19 os primeiros cargos voluntários propriamente ditos para partes cada vez maiores da população, tanto nas associações filantrópicas, clubes esportivos, clubes de mulheres e agremiações de trabalhadores, como a Allgemeiner Deutscher Arbeiterverein (Associação Geral dos Trabalhadores Alemães), precursora do Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD). O desejo de ajudar o Estado e a sociedade sem remuneração foi ganhando popularidade no final do século 19.

Picture Teaser Einer für alle! Ehrenamt in Deutschland Fußballtrainer
O instrutores voluntários são comuns em escolinhas de futebol alemãs

Voluntariado na ditadura

Seu declínio ocorreu na Alemanha sob os nazistas. A partir de 1933, eles foram fechando não só os partidos, como também clubes e associações. Doações eram feitas somente para o chamado Winterhilfswerk ("fundo de socorro de inverno"). As doações monetárias e materiais eram destinadas tanto aos soldados da frente de batalha como a famílias pobres. Pessoas que se negassem a angariar fundos para o Hilfswerk eram sujeitas tanto a sanções como aqueles que se negassem a doar. Havia casos de multas e até prisão.

Quando, nos anos 50, os voluntários voltaram novamente a ir de casa em casa para pedir dinheiro para instituições de caridade, o ceticismo em relação a eles era grande na Alemanha Ocidental, devido às experiências no período nazista. O trabalho de coletar doações ficou, assim, sendo visto como uma função voluntária sem prestígio social.

Velhas e novas formas

Nas primeiras décadas do pós-guerra, o voluntariado foi reativado. Ao longo dos anos, muitas organizações profissionalizaram suas estruturas, instituições de caridade passaram a empregar cada vez mais trabalhadores voluntários em tempo integral. Ao mesmo tempo, foram sendo formados novos grupos comunitários informais e projetos de autoajuda que se auto-organizam e onde as pessoas que compartilham a mesma preocupação e os mesmos problemas podiam se reunir.

Segundo estatísticas do governo alemão, os setores que empregam a maior quantidade de voluntários são os de esporte, educação, cultura, eclesiástico e social, além dos bombeiros voluntários e serviços de resgate. Com os movimentos pacifistas e ambientalistas, o voluntariado político ganhou nova força na Alemanha a partir dos anos 80.

Protesto político

Em 1981, o grupo Greenpeace fundou um escritório em Hamburgo. Voluntários planejavam e executavam campanhas contra a política estabelecida e que se destinavam a chamar a atenção para os danos ambientais. A partir dos movimentos pela paz e pelo meio ambiente, surgiram rapidamente organizações estruturadas de forma eficiente, que ainda hoje são mantidas, principalmente, por ativistas voluntários.

Greenpeace Protest Walfleisch-Transport
Protesto do Greenpeace em Hamburgo contra comércio de carne de baleiaFoto: picture-alliance/dpa

Também na Alemanha Oriental foi formada na década de 1980 uma cena ambientalista que fazia reuniões e campanhas públicas, criticando a política de desinformação do governo em relação a questões ambientais. Em última análise, esses movimentos criaram também o espaço intelectual que possibilitou a revolução pacífica que levou à queda do Muro, em 1989.

"Voluntariado compulsório"

Os movimentos populares do século 21 se tornaram mais diversificados. O engajamento se diversifica, o trabalho volutário passa a poder ser prestado não só em clubes e associações, mas também através de redes e agências de serviço voluntário, indo do compromisso a longo prazo até a ações de curto prazo. Assim, há pessoas que ajudam na distribuição de alimentos a desabrigados toda semana e outras que fazem isso apenas uma vez por ano.

Para motivar jovens a trabalhar voluntariamente, a Universidade de Mannheim lançou em 2003 um projeto chamado Service Learning, existente hoje também em outras universidades alemãs. Nele, estudantes de várias disciplinas trabalham voluntariamente durante um semestre em instituições sociais. Eles ganham, com isso, pontos úteis para a nota final do curso de bacharelado. Talvez seja esta uma nova forma de "voluntariado compulsório". Só o tempo mostrará se a ideia realmente incentiva os universitários a se engajarem de forma não remunerada durante a vida profissional.

O voluntariado na Alemanha não se desenvolve de forma necessariamente positiva. Há uma tensão entre voluntarismo e coerção. Hoje, o voluntariado é, para milhões de cidadãos, uma forma de participar ativamente da formação da sociedade alemã. Com o seu engajamento, os muitos voluntários não só ajudam o próximo, mas também contribuem para a melhoria do clima social no país.