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Unaids diz que conservadorismo atrapalha combate à aids no Brasil

19 de julho de 2012

Coordenador brasileiro do programa da ONU critica veto do governo brasileiro a um comercial voltado para o público gay e suspensão da distribuição nas escolas do kit anti- homofobia.

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Foto: picture-alliance/dpa

A América Latina é a região com maior índice de acesso à terapia antirretroviral, atingindo cerca de 70% da população, afirmou nesta quarta-feira (18/07) o coordenador do Unaids (Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV/Aids) no Brasil, Pedro Chequer, durante apresentação de um novo relatório sobre os avanços no combate à doença, em Brasília.

O melhor acesso à terapia antirretroviral ajudou a reduzir o número anual de mortes relacionadas à aids na América Latina de 63 mil para 57 mil em dez anos.

Parte deste cenário positivo se deve ao Brasil. "Já nos anos 1990, contrariando a opinião de instituições como o Banco Mundial e também da Europa e dos Estados Unidos, o país adotou uma política de Estado e, apesar de adversidades financeiras, mantém essa posição", comentou Chequer. Ele disse que a meta de zerar, em três anos, as infecções em crianças pode ser alcançada.

O relatório também destaca a autossuficiência brasileira no financiamento do programa de combate ao HIV, o vírus causador da aids. Segundo o Ministério da Saúde, o país produz hoje 10 dos 20 medicamentos distribuídos no tratamento e o país conseguiu uma economia de 95 milhões de dólares entre 2007 e 2011. Segundo Chequer, essa queda está relacionada com a diminuição de preços de medicamentos não produzidos no país. Mas ele adverte: "Há a necessidade de se utilizar mais as flexibilidades do acordo de Doha e fazer com que os países possam produzir genéricos localmente, independentemente da existência de patentes".

Conservadorismo religioso

Chequer lembrou que o Brasil é referência em campanhas de conscientização, mas ressaltou que o país corre o risco de um retrocesso nessa área devido ao conservadorismo religioso. "Na medida em que procura atender demandas de alguns segmentos sociais, o Brasil corre risco de retrocesso. Mas confiamos na equipe técnica do Ministério da Saúde e no entendimento que o país tem sobre os direitos humanos. Entendemos isso como uma situação passageira."

Ele estava se referindo a um recente episódio em que um vídeo da campanha de prevenção à Aids voltado para jovens gays, lançado este ano pelo governo brasileiro em parceria com a ONU, deixou de ser exibido na televisão aberta, ficando restrito a ambientes fechados, como boates. A medida sofreu críticas de movimentos de defesa dos direitos dos homossexuais.

O coordenador brasileiro da Unaids também criticou a suspensão da distribuição nas escolas da rede pública de kits com material educativo para conscientizar crianças e jovens a respeito da diversidade de opções sexuais. Em resposta, o representante do Ministério da Saúde, Dirceu Greco, garantiu que "a política brasileira continua caminhando no sentido do respeito aos direitos humanos", mas ressaltou que o país é composto de três poderes, fazendo referência às atribuições distintas do Legislativo, Executivo e Judiciário.

Chequer lembrou ainda que o Brasil é o país onde há mais crimes homofóbicos no mundo, seguido de México e Estados Unidos. "Esperamos que a sociedade civil se mobilize e o Congresso aprove a lei que criminaliza a homofobia. É uma lacuna importante e esperamos que aconteça ainda em 2012", disse o coordenador do Unaids no Brasil, referindo-se ao projeto que está atualmente em tramitação no legislativo brasileiro.

Comprimido controverso

Apesar de a Unaids ter elogiado a recente decisão do governo norte americano de aprovar o uso de terapia antirretroviral para prevenir a transmissão do HIV, o representante do programa no Brasil disse que é uma notícia que deve ser recebida com ressalvas.

"Há outras pesquisas que têm tanta ou maior relevância do que esta, como aquelas que estudam o uso de retrovirais para reduzir o risco de transmissão entre parceiros sexuais", disse Chequer. "Seria ético destinar milhões de comprimidos a pessoa que não estão infectadas em detrimento de 8 milhões que necessitam de tratamento e ainda não têm acesso?", questionou. Ele lembrou que ainda não é possível produzir a quantidade de medicamento necessária para tratar todos os infectados.

Greco disse que não existe pílula mágica e alertou para outro aspecto negativo do uso amplo do novo medicamento: o risco de os usuários do comprimido se sentirem tão seguros com a promessa de proteção e suspender outros métodos de prevenção, como a camisinha.

Num gesto que arrancou risos dos repórteres durante a coletiva em Brasília, Greco tirou dos bolsos dezenas de preservativos. O gesto teve como objetivo, segundo Greco, chamar a atenção para o risco e para dizer, também, que não basta ter o preservativo do bolso, mas é preciso ter a consciência de que o preservativo é hoje a maneira mais eficiente de evita Aids.

Autora: Ericka de Sá, de Brasília
Revisão: Alexandre Schossler