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Por que milhares retornam à Rússia após fuga devido à guerra

Irina Chevtayeva
8 de outubro de 2023

Com o início da invasão russa na Ucrânia e o anúncio de uma mobilização parcial, centenas de milhares de cidadãos fugiram da Rússia em 2022. Uma percentagem, porém, acabou voltando. Como eles veem seu futuro no país?

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A imagem mostra pessoas caminhando na região central de Moscou, com a Catedral de São Basílio ao fundo, na Praça Vermelha.
Um estudo estima que cerca de 16% dos russos que fugiram depois da invasão da Ucrânia teriam retornado ao paísFoto: Achim Scheidemann/dpa/picture alliance

Após o início da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, em 24 de fevereiro de 2022, a russa Kira foi primeiro para a Geórgia e depois para Israel. Na mesma época, Anna foi para a Armênia. E no outono de 2022, Yuri foi para o Cazaquistão, depois que o presidente Vladimir Putin anunciou a mobilização militar parcial.

Todos os entrevistados pela DW condenam a guerra da Rússia contra a Ucrânia, mas, mesmo assim, retornaram para seu país natal, neste meio tempo. Seus nomes foram alterados por questões de segurança.

"Feridas ainda precisam ser curadas"

Kira tem 27 anos e explica assim sua partida para a Geórgia na primavera de 2022: "Na época, me parecia impossível permanecer na Rússia". De lá, Kira seguiu para Israel, onde frequentou uma universidade, morou num alojamento e recebeu uma bolsa de estudos.

Porém o benefício sofreu corte radical meses depois, e a jovem não tinha permissão para trabalhar no país. Por isso, candidatou a um emprego numa organização da Rússia: "Quero me desenvolver profissionalmente. Deram-me uma chance e eu aproveitei." Por causa do novo emprego, Kira voltou a seu país de origem, embora siga matriculada na universidade israelense.

"As feridas em minha alma ainda precisam ser curadas, e eu tento não ir às grandes cidades. Sinto uma enorme resistência em relação ao que está acontecendo na Rússia e, muitas vezes, só quero fechar os olhos para tudo isso. Mas Israel provou ser um país difícil para mim."

"Uma fuga de mim mesmo"

Ana comenta assim sua partida da Rússia em abril de 2022: "A Armênia foi uma decisão impulsiva. Lá, porém, percebi que não se tratava de eu querer estar naquele país, mas sim de uma fuga de mim mesma."

Aos 31 anos, ela é gerente de marketing e poderia trabalhar em home office. Mas depois de alguns meses, decidiu deixar a Armênia: "Trata-se de voltar para a Rússia e admitir que você também carrega as próprias responsabilidades".

No entanto: "Não quero que todo mundo considere a guerra normal. Se escuto alguém dizer: 'Afinal, guerra é normal', vou responder: 'Não. Você está louco?'" Ela confessa que de fato é atormentada por medos e receios, mas enfatiza: "Não se pode viver com medo por muito tempo."

Russos são fotografados em uma estrada. Eles estão a pé e fogem da Rússia rumo à Geórgia devido à guerra na Ucrânia.
Em setembro de 2022, milhares de russos foram flagrados numa estrada rumo à GeórgiaFoto: Shakh Aivazov/AP/picture alliance

"Minha namorada praticamente me expulsou de casa"

Yuri, que é programador, conta que no início da guerra não entrou em pânico, a mobilização tampouco o assustou. "Mas a minha namorada estava muito preocupada, não conseguia dormir direito e praticamente me expulsou de casa. Eu não sabia o que me esperava. Mas nós nos dizemos: voltar, em poderia sempre. Agora, sair [da Rússia], talvez só fosse possível naquele momento", relembra.

Ele passou vários meses no Cazaquistão e depois mais um período no Quirguistão: "Achávamos que a situação seria resolvida logo e queríamos esperar pela segunda mobilização. Eu morava com seis homens num apartamento alugado. Mas depois de meio ano, nada mudou, exceto que o rublo continuou a cair, o custo de vida aumentou e algumas pessoas ao meu redor voltaram para a Rússia."

Ele também retornou no inverno: "Eu não sentia falta da Rússia, mas queria voltar para casa, para o meu apartamento". Além disso, seus pais, um irmão deficiente e sua namorada, com quem está junto há 13 anos, moram na Rússia.

Pelo menos duas ondas de emigração

Em 2022, entre 500 mil e 800 mil deixaram a Rússia, de acordo com estimativas de demógrafos baseadas em estatísticas de países anfitriões e informações de órgãos oficiais. Duas ondas de emigração foram registradas: a primeira ocorreu logo depois da invasão russa da Ucrânia, a segunda após o anúncio da mobilização parcial feito por Putin.

"Muita gente não foi parar nos países para onde realmente queria ir. A maioria mudou de país pelo menos uma vez. O máximo que eu ouvi foi que um jovem casal esteve num total de seis países", comenta a socióloga Lyubov Borusyak, residente em Moscou.

Segundo ela, muitos estão em países para onde nunca imaginaram ir, praticamente sem documentos e com pouco dinheiro: "Parte deles depois voltou para a Rússia, pelo menos por um tempo."

Segundo enquetes da equipe de pesquisa OutRush com emigrantes russos, 16% dos que deixaram a Rússia após 24 de fevereiro de 2022 já retornaram. Dois terços alegam estar de volta apenas temporariamente.

Para onde ir na próxima vez?

Yuri enfatiza que ele e a namorada já estavam pensando em deixar a Rússia há tempos, mas não sabiam para onde ir. Atualmente, o casal encontra-se num limbo: "Gostaríamos de viver na Rússia, mas o problema é o regime e a política", admite.

Anna, por sua vez, sente-se decepcionada, desde seu retorno, com o fato de que, para a população russa, a vida simplesmente continua: "Sinto-me como num filme em que todos fingem que tudo está normal. Para mim, às vezes, é muito difícil e muito triste ver como as coisas podem mudar para pior." Em até um ano, ela quer deixar a Rússia novamente, desta vez rumo a Berlim ou Bali.

Kira também pensa para onde ir numa próxima vez. Ela considera os Estados Unidos, Canadá, Reino UnidoAlemanha como possíveis destinos.