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Retorno à normalidade difícil para emergentes

Rolf Wenkel (av)31 de janeiro de 2014

Quando o Federal Reserve fecha a torneira da compra de obrigações, os mercados emergentes sofrem. Mas mudança estava anunciada e, no fim das contas, seus efeitos serão positivos para todos, opina Rolf Wenkel.

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Ben Bernanke entrega a Janet Yellen, neste sábado (01/02), o posto de presidente do Federal Reserva (Fed, o banco central americano). Como último ato de sua gestão, e apesar das turbulências cambiais nos mercados emergentes, ele limitou as compras mensais títulos de dívidas públicas pela instituição a 65 bilhões de dólares – uma redução de 10 bilhões de dólares.

Porträt - Rolf Wenkel
Foto: DW

A justificativa apresentada foi que o impulso positivo nos EUA e as melhores perspectivas no mercado de trabalho oferecem espaço para tal medida. Apesar das turbulências recentes, as vicissitudes dos países emergentes não foram mencionadas com uma palavra sequer.

E, no entanto, trata-se de vicissitudes consideráveis. Elas já o eram quando os bancos centrais do Ocidente baixaram os juros a zero ou quase zero por cento. O resultado foi uma maciça transferência de capital de investimento dos países industriais para os emergentes, que subitamente passaram a ser a esperança da economia mundial – brilhando com índices de crescimento elevados e oferecendo juros e rendimentos relativamente altos.

A princípio, é uma alegria para qualquer ministro da Economia ou das Finanças o seu país ser considerado atraente ao ponto de captar capital estrangeiro. É uma promessa de investimentos, crescimento e postos de trabalho: o despontar de uma época de ouro, enfim. Porém, é como na medicina: tudo depende da dose. E essa avalanche de dinheiro foi claramente grande demais para os emergentes.

As moedas nacionais foram submetidas a forte pressão de valorização, o que encareceu as exportações, prejudicou a balança comercial e fomentou a inflação. Resumindo: o novo afluxo de capital bagunçou de tal forma os mercados emergentes que o ministro brasileiro da Fazenda, Guido Mantega, por exemplo, chegou a falar de uma "guerra cambial" e considerar seriamente medidas para controle das transações de capitais.

Entretanto, não foram, em absoluto, especuladores malvados a, na época, promover a evasão de capital dos países industriais, mas sim bancos, seguradoras, fundos de aposentadoria e outros investidores institucionais, sempre em busca de rendimentos. E foi justamente Ben Bernanke que, com o seu programa de compra de títulos, ao longo dos anos injetou nos mercados a inimaginável soma de 4 trilhões de dólares, aquecendo, assim, o fluxo gigantesco de capital para as jovens e ascendentes economias nacionais.

Agora o Fed fecha a torneira, e o dinheiro reflui dos emergentes para os países industriais. E os jovens mercados se queixam da queda vertiginosa de suas moedas, e de que, com o capital, lhes teria sido retirada a base para o crescimento. No entanto, o que acontece agora, a rigor, não passa de um retorno à normalidade.

Um banco central como o americano não pode manter as taxas de juros infinitamente em 0% e continuar imprimindo dinheiro, quando a economia já se encontra a caminho de uma robusta recuperação. O Fed já cometeu esse erro no início deste século, o que levou à crise do subprime, passando pela crise imobiliária dos EUA, e quase desembocando no colapso global.

Na realidade, o Federal Reserve já anunciara quase um ano atrás o abandono da política monetária excessivamente generosa. E antes mesmo disso, teria sido possível preparar-se para uma mudança de clima, tornar a economia nacional mais resistente contra influência externas, através de reformas estruturais.

China, Polônia, México e Filipinas parecem ter conseguido manter suas taxas de inflação moderadas e suas balanças comerciais relativamente equilibradas, apesar do dinheiro barato. O mesmo não se deu em Brasil, Argentina, África do Sul, Índia, Indonésia e Turquia. Pelos motivos mais diversos, essas nações obviamente perderam a chance de tornar mais resistentes as suas economias, e agora sofrem as consequências.

Seja como for, resta um consolo: quando a poeira das turbulências cambiais baixar, os emergentes logo registrarão que uma moeda menos valorizada e a recuperação dos Estados Unidos também têm suas vantagens. Para a indústria nacional de exportação, para a balança comercial, para a estabilidade monetária. E isso ajudará a voltarem à normalidade.