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Não rolou beijo na Globo

Thomas Milz
Thomas Milz
23 de agosto de 2022

Antes da entrevista ao Jornal Nacional, Bolsonaro riu e disse que daria um beijo no Bonner. Mas o que se viu foi um presidente de cara amarrada, mentindo e tentando se defender com os mesmos argumentos de sempre.

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Jair Bolsonaro durante entrevista ao Jornal Nacional
Bolsonaro durante entrevista ao Jornal NacionalFoto: Igor Do Vale/ZUMA/picture alliance

A entrevista de Jair Messias Bolsonaro ao Jornal Nacional (JN) nesta segunda-feira (22/08) não trouxe novidades. Já conhecíamos as perguntas dos apresentadores e as respostas do presidente. As únicas notícias da noite foram a barba branca de William Bonner e uma batata frita famosa na Zona Norte do Rio.

Houve tempos no Brasil em que a grande pergunta era: vai rolar um beijo gay na novela? Nesta segunda, Bolsonaro ameaçou dar um beijo no Bonner. Mas não deu! Num vídeo publicado antes da entrevista com o presidente, alguém comenta com Bolsonaro: "Olha a cara do presidente preocupado com o JN." Aí Bolsonaro ri e diz que vai dar um beijo no apresentador. Mas quando começou a sabatina no Jornal Nacional, vimos Bolsonaro de cara amarrada.

Bonner, por sua vez, estava alegre, sorridente. Eu não me lembrava de ter visto a barba dele tão branca. Perguntou ao presidente o que ele pretende ao xingar ministros do STF. Bolsonaro logo acusou o apresentador de fake news. Nunca houve xingamento, disse o presidente. Houve sim, replicou Bonner, fazendo uma pausa teatral e, então, dizendo: "O senhor xingou um ministro do Supremo de canalha." Bolsonaro só conseguiu murmurar: "Ele vinha fazendo contra mim…" O sorriso de Bonner sinalizou: pegamos o presidente na mentira, logo na primeira pergunta!

E por aí foi. Os apresentadores lembrando as frases polêmicas do presidente, que todos nos já conhecemos, e Bolsonaro tentando se defender o tempo todo com os mesmos argumentos de sempre.

Bonner lembrou que os apoiadores de Bolsonaro pedem o fechamento do STF e uma intervenção militar "com Bolsonaro". "Liberdade de expressão", respondeu o presidente.

Promover medicamentos ineficazes contra a covid? Bolsonaro: o grande erro foi a grande mídia, como a Globo, desestimular o tratamento precoce, "que é conhecido como liberdade do médico".

Desestimular a vacinação dizendo que quem fosse imunizado viraria jacaré? "Usei uma figura de linguagem, ‘jacaré’."

Mas a covid já é passado. Hoje, a grande pergunta parece ser como melhorar a economia no meio das turbulências globais causadas pela guerra na Ucrânia. Bolsonaro relaxou, pois eis um tema em que ele tem bons argumentos. Comparado com muitos outros países do mundo, o Brasil está indo melhor, economicamente. Graças aos benefícios sociais distribuídos pelo governo, diz.

E as queimadas na Amazônia? Olha lá a França e a Califórnia pegando fogo, aponta o presidente. "No Brasil, infelizmente, não é diferente. Acontece." 

Lembrei-me de quando o Museu Nacional pegou fogo, em 2018. A reação de Bolsonaro foi a mesma. "Já está feito, já pegou fogo, quer que faça o quê? O meu nome é Messias, mas eu não tenho como fazer milagre."

Como não faz milagres, não sabia das verdadeiras intenções dos diversos ministros do MEC nomeados por ele. Havia um que até distribuiu dinheiro público através de pastores. Bolsonaro: "As pessoas se revelam quando chegam." Parece que a frase tão querida dele e da sua esposa de que "Deus capacita os escolhidos" só se aplica a ele, Bolsonaro, e não a seus ministros. Azar do Brasil!

"Já acabou?", perguntou Bolsonaro, quando foi anunciado o fim da entrevista. "Eu queria ficar algumas horas com vocês aí", confessou. Mas, aparentemente, seu desejo não foi correspondido por William Bonner e Renata Vasconcellos.

Rechaçado pelos apresentadores globais, o presidente teve de se contentar com uma batata frita, supostamente famosa, na Zona Norte do Rio, dividida com seu filho Flávio Bolsonaro. Para o senador, a noite deve ter sido muito boa. Afinal, nem falaram de rachadinha ou do Queiroz na Globo.

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Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.

O texto reflete a opinião do autor, não necessariamente a da DW.

Thomas Milz
Thomas Milz Jornalista e fotógrafo
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Realpolitik

Depois de uma década em São Paulo, Thomas Milz mudou-se para o Rio de Janeiro, de onde escreve sobre a política brasileira sob a perspectiva de um alemão especializado em Ciências Políticas e História da América Latina.