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EconomiaLetônia

Como o álcool ocidental continua a fluir para a Rússia

Jennifer Pahlke
13 de fevereiro de 2024

Em meio à guerra na Ucrânia, produtores de uísque e vinho da Europa Ocidental usam países do Báltico como rota alternativa para continuar vendendo seus produtos para a elite russa e obter bons lucros.

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Garrafas de vinho em supermercado
Bebidas alcoólicas ocidentais ainda podem ser vistas em grandes quantias nas lojas russasFoto: Yegor Aleyev/TASS/picture alliance

A Letônia se tornou o principal país fornecedor de uísque da Rússia no ano passado. Nos primeiros nove meses de 2023, a Rússia importou carregamentos de uísque que somaram quase 244 milhões de euros.

De acordo com a agência de notícias russa RIA Novosti, a Letônia foi responsável por quase três quartos desse valor, ou seja, 177 milhões de euros. Em segundo lugar – mas bem atrás – está outro país báltico: a Lituânia vendeu à Rússia cargas de uísque que somaram pouco menos de 27 milhões de euros.

Entretanto, não se trata apenas de aguardente envelhecido em barris, mas também de vinho. Com entregas no valor de 73 milhões de euros, a Lituânia substituiu a Itália como principal fornecedor, exportando vinho no valor de quase 68 milhões de euros para a Rússia entre janeiro e agosto de 2023.

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De acordo com o Instituto de Estatística da Letônia, o total de todas as exportações da Letônia para a Rússia em 2023 (até novembro) foi de mais de 1,1 bilhão de euros. Quase metade dessas exportações envolve bebidas, destilados e vinagre. Isso faz da Rússia um dos cinco maiores mercados de exportação da Letônia em termos de volume em 2023.

Mesmas cadeias de suprimentos, documentação diferente

É claro que os países bálticos não se tornaram repentinamente uma região vinícola lucrativa ou um ponto para a produção de uísque. Em vez disso, a grande maioria das bebidas alcoólicas exportadas da Letônia para a Rússia vem de empresas da Europa Ocidental registradas na Letônia. Isso já foi admitido por representantes da Associação do Setor de Álcool da Letônia.

"Parece que algumas grandes empresas de países da Europa Ocidental simplesmente usam a Letônia como uma espécie de centro de distribuição", diz Matiss Mirosnikovs, economista do Banco da Letônia, em entrevista à DW. "Portanto, não se trata necessariamente da produção da indústria letã, mas de reexportações."

Pessoa serve vinho em uma taça, com homem de paletó e gravata sentado à mesa ao fundo
A Letônia exporta hoje mais vinho para a Rússia do que a Itália, que é conhecida por sua produção da bebidaFoto: PHILIPPE DESMAZES/AFP/Getty Images

Em entrevista à RIA Novosti, Veniamin Grabar, chefe da empresa russa de importação de bebidas alcoólicas Ladoga, explicou por que os países bálticos aparecem nas estatísticas alfandegárias como nações de origem: "Se os documentos costumavam dizer que as importações para a Rússia simplesmente passavam pela Letônia ou Lituânia, agora os países bálticos aparecem como o destino da exportação. E as entregas para a Rússia são feitas a partir de lá."

As cadeias logísticas, portanto, não mudaram. São os mesmos produtores que abastecem a Rússia – a única diferença é que a documentação agora lista a Letônia como país de destino. Os parceiros letões, por sua vez, agora cuidam das exportações da UE para a Rússia, incluindo documentos alfandegários e assim por diante.

Tática para evitar danos à imagem

A rigor, as exportações não violam as sanções da UE. "No entanto, o fato de a Letônia estar sendo usada como um centro de distribuição mostra que muitas empresas da Europa Ocidental temem danos à sua imagem caso exportem diretamente para a Rússia", diz Matiss Mirosnikovs. Para outras empresas, é uma questão de sobrevivência: "Algumas empresas só têm Rússia e Belarus como clientes. É por isso que elas não querem e, acima de tudo, não podem simplesmente parar de fazer negócios."

Para algumas organizações independentes, no entanto, esses negócios envolvem questões éticas, tendo em vista a guerra de agressão contra a Ucrânia lançada por Moscou. A ONG Moral Rating Agency, por exemplo, classifica as empresas ocidentais de acordo com seus negócios com a Rússia. De acordo com a agência, a empresa francesa Pernod Ricard – conhecida por marcas como a vodca Absolut e o uísque Jameson – continua sendo um dos maiores fornecedores de bebidas alcoólicas para a Rússia.

A mídia russa informou que a Pernod Ricard estava planejando descontinuar seus negócios na Rússia. No entanto, de acordo com um comunicado à imprensa do gigante das bebidas alcoólicas, isso ainda levará "vários meses". Funcionários russos continuam a ser pagos. E o chamado comércio paralelo via terceiros países parece continuar a todo vapor. A Pernod Ricard na Letônia não respondeu a um pedido de entrevista da DW. O mesmo ocorreu com outros exportadores de álcool que usam a Letônia como base de reexportações.

Envios de bebidas alcoólicas para a Rússia são repreensíveis?

Davis Vitols, chefe da Associação da Indústria do Álcool da Letônia (Lana), apresentou um argumento muito pitoresco para justificar a continuidade dos negócios: segundo ele, não há problema em exportar álcool porque a substância é "prejudicial à saúde se consumida em excesso". Ele, no entanto, enfatizou que essa era sua opinião pessoal, e não a da associação.

O economista Matiss Mirosnikovs também tem uma opinião pessoal sobre o tema: "Há dois lados. Por um lado, é bom receber dinheiro da Rússia, porque assim eles podem gastar menos dinheiro em fins militares. Por outro lado, isso permite que as elites façam o que querem, ou seja, levar uma vida o mais normal possível, sem querer promover nenhuma mudança."

Vista aérea de Riga
Riga, capital da Letônia: país se tornou principal país fornecedor de uísque da Rússia em 2023Foto: DW

Comércio de álcool contrasta com política do Báltico em relação à Rússia

O crescente comércio de bebidas alcoólicas com a Rússia contrasta fortemente com a política dos países bálticos em relação à Rússia. A Letônia, a Lituânia e a Estônia estão entre os países que mais impulsionaram as sanções da UE contra a Rússia. Muito antes da guerra na Ucrânia, o trio, que permaneceu décadas sob domínio russo, alertou contra a rota agressiva do Kremlin.

A Estônia e a Letônia também tomaram medidas para desestimular o uso do idioma russo em seus territórios. Agora, a educação deve ser conduzida apenas nos respectivos idiomas nacionais. Qualquer pessoa que deseje viver na Letônia com um passaporte russo, mesmo que já tenha passado toda a sua vida no país, deve agora atingir o nível intermediário do idioma letão. Caso contrário, corre o risco de ser expulsa.

Portanto, por um lado, esses países têm tomado medidas para diminuir a influência russa em seus territórios. Por outro lado, há sinais de menos preocupação quando se trata de lucro. O Ministério da Agricultura da Letônia, responsável pela produção e pelo comércio de álcool no país, respondeu a um pedido de comentário da DW com uma resposta negativa: não há disponibilidade para entrevistas em um futuro próximo.

Quando questionado sobre as exportações para a Rússia, o ministro da Economia da Letônia, Ilze Indriksone, disse à mídia letã que o governo vem pedindo às empresas que parem de negociar com a Rússia e Belarus. "Também discutimos o fechamento físico da fronteira e a interrupção do transporte terrestre. Mas, se apenas nós fecharmos a fronteira, e não todos os países que fazem fronteira com a Rússia, isso não trará nenhum resultado", afirmou.