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PolíticaÍndia

A controvérsia em torno do novo templo hindu aberto na Índia

Murali Krishnan de Nova Déli
23 de janeiro de 2024

Projeto nacionalista hindu avança inexoravelmente. Oposição boicota inauguração do prédio, alegando que evento é campanha eleitoral antecipada do primeiro-ministro Narendra Modi.

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Multidão em frente a um templo
Cerimônia de inauguração do Templo Ram, em AyodhyaFoto: Rajesh Kumar Singh/AP Photo/picture alliance

O primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, inaugurou nesta segunda-feira (22/01) o Templo Ram, na cidade indiana de Ayodhya. Os devotos acreditam que o grande templo foi construído no local de nascimento de Lord Ram, uma divindade hindu sagrada adorada por milhões de devotos.

A cerimônia de inauguração transcorre cerca de três meses antes da eleição nacional na Índia, e muitos políticos da oposição dizem que ela será um evento de campanha velado para o Partido Bharatiya Janata (BJP) de Modi, que é favorito para obter a terceira vitória consecutiva nas urnas.

Os partidos do bloco de oposição – conhecido como Indian National Developmental Inclusive Alliance (Aliança Inclusiva Nacional indiana para o Desenvolvimento) – boicotaram a cerimônia de inauguração do Templo Ram.

Ayodhya, em Uttar Pradesh, passou por uma grande transformação antes do evento, tendo estradas ampliadas, recebendo um novo aeroporto e uma nova estação ferroviária, além de um estacionamento de vários níveis.

O Departamento de Meteorologia da Índia lançou até um site para fornecer informações relacionadas ao clima específico de Ayodhya. Os organizadores do fundo para o templo enviaram cerca de 8 mil convites, incluindo uma longa lista de industriais influentes, lendas do críquete e ícones de Bollywood.

Abrindo velhas feridas

O Templo Ram foi construído no local onde o Babri Masjid, ou Mesquita de Babur, esteve por séculos, antes de sua demolição em 1992 por extremistas hindus, num esforço para mudar as bases seculares da Índia para uma identidade mais visivelmente hindu.

Guarda em frente a um prédio antigo cercado por muros
Babri Masjid ou Mesquita de Babur em foto de 1990: templo muçulmano foi demolido por fanáticos hindusFoto: picture-alliance/AP Photo/B. Walton

A demolição da mesquita Babri Masjid provocou tumultos religiosos em toda a Índia, com cerca de 2 mil vítimas, a maioria delas, muçulmanas. Em 2019, a Suprema Corte da Índia concedeu o local aos hindus, abrindo caminho para a construção do Templo Ram onde era a mesquita destruída. Os residentes muçulmanos de Ayodhya dizem que a inauguração do templo evocará as lembranças sangrentas da violência ocorrida décadas atrás.

Mas o novo templo e sua inauguração cumprem uma importante promessa de campanha de Modi e de seu partido nacionalista hindu. De acordo com Gilles Verniers, membro do think tank indiano especializado em política pública Centre for Policy Research (CPR), esse fato pode alavancar ainda mais as perspectivas de vitória do BJP de Modi nas eleições gerais de 2024.

A consagração do Templo Ram marca tanto o ponto culminante da campanha de uma década para "reivindicar como território hindu um disputado local religioso, no momento em que o projeto de construção de uma nação hindu se torna oficial e totalmente endossado pelo Estado", afirma Verniers.

Ele destacou que a inauguração do Templo Ram é menos um ponto de virada do que um acelerador do projeto majoritário dos nacionalistas hindus: "Nessa data, quaisquer muros ou princípios constitucionais que mantiveram a religião à margem da política serão derrubados, dando um novo impulso a campanhas semelhantes que têm como alvo locais religiosos e culturais muçulmanos na Índia."

Momento de triunfo para os nacionalistas hindus

O governador de Uttar Pradesh, Yogi Adityanath, considerou a inauguração do Templo Ram um "festival nacional" e declarou feriado público nesta segunda-feira para todas as instituições educacionais.

Nilanjan Mukhopadhyay, um analista político que acompanha o movimento pelo Templo Ram desde o início da década de 1980, disse que o evento está sendo realizado para garantir e fortalecer o poder político.

Homens tiram hastes de metal de cerca e as batem em muro de tijolos
Em 1992, extremistas hindus demoliram mesquita, que ficava onde hoje está o templo hinduFoto: Getty Images/AFP/D. E. Curran

Ele até traçou paralelos com a partição de 1947, que dividiu a Índia britânica em duas nações: Índia, de maioria hindu, e Paquistão, de maioria muçulmana. "Tornou-se um movimento de massa a partir de 1989. É um projeto político que reconfigurou a Índia, e nossa maneira de ver a sociedade e a política passou por uma mudança fundamental. É mais do que um ponto de virada. É um ponto em que a política hindu entrou na corrente principal da política indiana."

Mukhopadhyay salientou que a história não terminará com o Templo Ram: "Esse evento não sinaliza o encerramento de questões usadas para atingir indivíduos segundo linhas de identidade e crenças. Em vez disso, anuncia o início de uma nova era de shows repetidos em outras cidades, vilas e aldeias. Mathura e Varanasi estão esperando para seguir a mesma trajetória."

Atualmente há um debate sobre a centenária mesquita Gyanvapi, em Varanasi, uma das cidades mais sagradas do hinduísmo, e a mesquita Shahi Idgah, em Mathura, alimentando novas tensões entre as duas maiores comunidades religiosas da Índia.

Vinay Sahasrabuddhe, ex-parlamentar e vice-presidente nacional do BJP, destacou que o Templo Ram é um ponto de virada na história cultural da Índia. "Esse templo é um símbolo de nossa capacidade de proteger nosso respeito próprio. O que está sendo construído em Ayodhya não é apenas um templo de tijolos e argamassa, mas um monumento que saúda a jornada civilizatória da Índia."