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Moçambique: Venâncio Mondlane foi calculista?

Nádia Issufo
11 de março de 2024

Deputado da RENAMO Venâncio Mondlane já criticou a Justiça no passado - nas últimas autárquicas defendeu que o seu partido foi defraudado. Mas agora recorreu à mesma Justiça "parcial" para travar o líder Ossufo Momade.

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Deputado da RENAMO, Venâncio Mondlane
Foto: R. da Silva/DW

Terá Venâncio Mondlane sido calculista ao usar de uma Justiça que aparenta servir ao Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), no poder, para decidir sobre a liderança do partido concorrente, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO)? O que fala mais alto para o membro do maior partido da oposição em Moçambique, a democracia na RENAMO ou lograr as suas ambições a qualquer custo? É que o partido já anda com a imagem comprometida devido a crises internas que se agudizam em ano eleitoral.

A DW África colocou estas e outras questões ao analista político Ivan Maússe, depois do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo ter aceite a providência cautelar submetida por Mondlane, que limita os poderes do líder da RENAMO, Ossufo Momade. Em causa estão supostas violações de estatutos do partido.

DW África: Venâncio Mondlane recorre a uma Justiça em que ele próprio não confia, por não ser credível, para fazer justiça num caso contra o seu partido. Não é um paradoxo?

Ivan Maússe (IM): Eu penso que não se trata de um paradoxo como tal. Este é um ano em que Venâncio Mondlane se pretende candidatar à liderança da RENAMO e [por conseguinte] à Presidência da República, num contexto em que há uma violação clara dos estatutos por parte do atual líder da RENAMO. Não cabe a Venâncio Mondlane recorrer a outro local, senão às próprias instituições de Direito em Moçambique, mesmo sob essa suspeita de que funcionam em benefício ou sob influência do partido FRELIMO. Não há outro local a que ele possa recorrer senão a esses tribunais de que ele próprio pode desconfiar.

Analista moçambicano Ivan Maússe
Ivan Maússe: "Não cabe a Venâncio Mondlane recorrer a outro local, senão às próprias instituições de Direito em Moçambique"Foto: privat

DW África: De uma Justiça que serve alegadamente os interesses do partido que governa, é esperado que prejudique a liderança do principal concorrente, a RENAMO. Terá Venâncio Mondlane sido calculista na sua jogada?

IM: Olhando para o perfil político de Venâncio Mondlane e para a prestação dele durante as eleições autárquicas do ano passado - olhando também para o facto de a liderança máxima da RENAMO não estar a ser aceite e numa altura em que a RENAMO deveria realizar o congresso antes mesmo do fim do mandato de Ossufo Momade - não havia outra alternativa para Venâncio Mondlane senão desencadear todos os mecanismos legais que tem à disposição para que possa tentar se candidatar à presidência do partido e, consequentemente, à Presidência da República. Portanto, é uma decisão ousada, mais que era necessária, tendo em conta os objetivos dele próprio como político e a bem da própria democracia.

DW África: Abrir um precedente destes na RENAMO com as eleições à porta é como continuar a "golpear um morto"?

IM: Eu penso que não. Quando se chega à fase das eleições, a RENAMO tem sempre esse tipo de problemas e, no caso das eleições gerais deste ano, eu penso que era importante que a RENAMO se pudesse perfilar com um candidato que, de alguma forma, granjeasse alguma simpatia fora do partido. Então, eu penso que é uma oportunidade única para se medir até que ponto funciona a democracia interna dentro da própria RENAMO.

Em Maputo, Mondlane acusa FRELIMO de fraude eleitoral

DW África: Mas Venâncio Mondlane é um candidato de massas urbanas, e Moçambique é muito mais do que a capital moçambicana...

IM: Sem dúvida. Por conta dessa ala militar e pelo facto de a RENAMO ter pessoas que se consideram fundadoras do partido, que apoiam Ossufo Momade, mesmo por conta das possíveis benesses que eles têm por estarem a apoiar Ossufo Momade, há um grande trabalho por parte de Venâncio Mondlane em relação às bases, que não se encontram nas cidades capitais, mas na zona rural. E se ele conseguir granjear simpatia a nível das bases, ele poderá ter algum sucesso político a nível das provinciais.

DW África: Esta ação de Venâncio Mondlane é uma busca por justiça e democracia no seio do partido em que ele é a cara pelos descontentes ou não passa mesmo de uma forma de atingir as suas ambições?

IM: Eu olho para as duas vertentes. Primeiro, é importante que, de facto, ele possa sagrar as suas ambições políticas. Todo o político pretende alcançar o poder.

DW África: Acha que ele está a tentar fazer isso a qualquer custo?

IM: Eu não olharia na perspetiva de ser a qualquer custo, por uma simples razão: se notarmos as intervenções políticas de Venâncio Mondlane desde o ano passado a esta parte, ele tem-no feito com base na lei e no Estado de Direito democrático. Não é Venâncio Mondlane que está a aparecer a violar normas estatutárias ou normas vigentes em Moçambique em matéria de participação política. Ele está, na verdade, a exigir com que as obrigações estatutárias do seu partido sejam cumpridas.