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As mãos seletivas de Reinata Sadimba

31 de julho de 2012

Reinata Sadimba é a ceramista mais prestigiada de Moçambique. As suas vivências, a sua cultura e o seu dom misturam-se nos seus trabalhos, resultando em obras singulares que atraem a atenção de qualquer um.

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Reinata Sadimba, ceramista e escultora Makonde, Moçambique
Reinata Sadimba, ceramista e escultora Makonde, MoçambiqueFoto: Nadia Issufo

Reinata Sadimba é uma mulher muito particular. Brilha numa profissão dominada por homens, assume também a função de homem nas lides domésticas e até em momentos de lazer. O seu forte carácter é fácilmente perceptível na objetividade dos seus discursos, na tomada de pequenas decisões e principalmente nas suas obras.

Os objetos de barro desta escultora moçambicana são inconfundíveis. Mas na hora de moldar o barro, os homens não têm grande espaço nas suas mãos. "Gosto mais de representar a mulher, não gosto de representar homens porque eles não gostam de mim porque sou velha", revela a artista em meio de gargalhadas. Apesar de tudo, Reinata garante que gosta deles.

O trabalho artístico de Reinata Sadimba é muito determinado pelas suas experiências pessoais. Os maus tratos que terá sofrido do marido, e consequente separação, atiraram-na para o barro. E daí nunca mais saiu.

Artista obedece cegamente à sua inspiração

A ceramista gosta de se vestir de homem nas danças da sua terra
A ceramista gosta de se vestir de homem nas danças da sua terraFoto: DW/N. Issufo

Mas esta é uma arte que já aprendeu com a sua mãe desde os sete anos. Antes disso roubava barro, esculpia e ia cozer os objetos sozinha. A ceramista lembra como começou: "Eu fazia potes muito grandes e até chorava porque não conseguia carregá-los. A minha mãe tranquilizava-me e ensinava-me a fazer potes mais pequenos."

Reinata Sadimba nasceu na província nortenha de Cabo Delgado e pertence à etnia makonde, uma das mais fechadas do país. Depois de adulta viveu na Tanzânia por alguns anos, na companhia da sua irmã.

É escultora também, mas a sua paixão é mesmo a cerâmica. Quando os momentos de inspiração batem à sua porta, ela não hesita em recebê-los, mesmo que sejam duas da manhã, aliás, hora em que mais gosta de trabalhar. O sonho já foi o motor de Reinata: "Quando sonhava, de manhã concretizava os meus sonhos no barro. Mas agora já não sonho, as ideias surgem e concretizo-as."
 
A escultora makonde leva a sua arte pelo mundo e já expôs em várias partes do mundo, principalmente na Itália e em Portugal. Conta que os principais compradores da sua obra são os estrangeiros. Os nacionais já compraram mais no passado.
 
As tradições à volta do barro

Na capital moçambicana, a ceramista costuma trabalhar no Museu de História Natural
Na capital moçambicana, a ceramista costuma trabalhar no Museu de História NaturalFoto: DW/N. Issufo

Nas obras de Reinata encontram-se muitas vezes cobras e tartarugas. Estes animais estão ligados aos contos e às lendas da sua província. Esta associação de lendas com os objetos de uso doméstico, como os potes por exemplo, tem agradado aos seus compradores.

Mas esta mulher de mão cheia consegue dedicar-se ainda a outras atividades. Só que algumas delas também dominadas por quem usa calças. Por exemplo, ela gosta de cultivar a terra e de cortar lenha no mato. Reinata já foi muito longe no que se refere à independência: "Também construí a minha casa sem a ajuda de nenhum homem. É a minha maneira de ser."

Mas para compensar tudo isso, o seu lado feminino é focalizado para o lado mais inclusivo da sua cultura: os ritos de iniciação. Ela lidera este processo. No entanto, sobre este tema a ceramista fecha-se em copas. Ela tem a cara tatuada, segundo as tradições makondes e não fala português. Uma mulher que é generosa na arte, mas que sabe dosear as suas revelações em diálogos.

Autora: Nádia Issufo
Edição: Madalena Sampaio/António Rocha

23.07.12. Reinata Sadimba, a mulher de calcas - MP3-Mono