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Liberdade de expressãoAngola

Angola: "O pós-eleições está cada vez mais perigoso"

21 de setembro de 2022

Cresce a onda de intimidação contra os cidadãos que criticam publicamente a governação do MPLA. São vários os relatos de perseguições e detenções. Ativistas dizem que Angola caminha para uma "tirania".

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Foto: John Wessels/AFP/Getty Images

A noite de terça-feira foi de terror para a mulher e o filho do jornalista Cláudio Emanuel "In".

O profissional da Rádio Despertar não estava em casa; dois homens encapuzados arrombaram a porta; com uma faca quente, fizeram mais de 30 cortes nos membros inferiores e superiores da esposa, e ameaçaram matar o seu filho.

"Fizeram a minha esposa refém, amarraram-na, apontaram uma faca ao meu filho de um ano e disseram: 'se tu gritares, vamos matar o teu filho aqui'", conta Cláudio "In" em entrevista à DW África.

A tortura começou depois: "Começaram a fazer os cortes à minha esposa, deram-lhe várias chapadas, pontapearam-na, deram-lhe um murro no estômago. Está com as pernas e os braços todo cortados."

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Os agressores deixaram uma nota com um aviso para Cláudio "In". As agressões têm a ver com o trabalho que tem feito na rádio, afirma.

"Tivemos lá um convidado que criticou muito o trabalho do serviço de inteligência. Só pode ser por causa disso. Eles não roubaram nada, não levaram nada de casa. Apenas destruíram tudo, desarrumaram tudo, partiram a loiça. Tinham uma chave-mestra que poderia abrir as portas. É trabalho profissional."

Perseguições e detenções de vozes críticas

O ataque aconteceu horas depois da libertação de vários ativistas angolanos, acusados de incitarem a rebelião.

Nas últimas semanas, muitos jovens foram detidos depois de criticarem a validação dos resultados eleitorais, que deram a vitória ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). O Exército foi colocado nas ruas e está em "prontidão combativa".

Para o jornalista Cláudio "In", trata-se de "terrorismo" de Estado contra quem ousa opor-se ao partido no poder.

"Vão silenciar todos, porque não há quem aguente que se metam com a sua família, com a sua esposa e o filho de um ano. Ameaçar matar um bebé de um ano perante a sua mãe indefesa, isso é um ato de mais puro terrorismo que ouvi", afirma o jornalista.

A polícia esteve na residência de Cláudio "In", em Luanda, e ainda não se pronunciou sobre o assunto.

O ativista angolano Osvaldo Caholo conta que também tem sido ameaçado. Caholo diz que foi detido no dia da investidura do Presidente da República, a 15 de setembro, depois de ter criticado o Governo numa entrevista concedida à DW África.

Ativista angolano Osvaldo Caholo
Osvaldo Caholo: "O MPLA vai usar todas as armas para reiniciar o país"Foto: B. Ndomba/DW

"Na entrevista, eu dizia que a sociedade civil tem um plano para contornar os cinco anos de terrorismo de Estado que o MPLA vai exercer. Em conversa, o comandante da esquadra disse-me que o áudio da DW terá preocupado as autoridades de topo do MPLA, e a nível superior houve uma ordem para a minha detenção. Fiquei detido das 7h às 16h."

A "tirania de João Lourenço"

Caholo acredita que Angola está a caminho de uma "tirania". "Isto ainda não terminou por aqui, penso que o pós-eleições está cada vez mais perigoso", comenta o jovem.

"O MPLA - apercebendo-se da evolução da consciência dos cidadãos, [que veem cada vez mais] a necessidade de pôr fim [à governação] deste partido maquiavélico - vai usar todas as armas para reiniciar o país."

Em declarações à DW África na semana passada, o porta-voz do Serviço de Investigação Criminal, Manuel Halaiwa, negou que as detenções tenham motivos políticos.

Os jovens detidos estavam a incitar a rebelião nas redes sociais, justifica o SIC: "Todos aqueles que estiverem a ser detidos estão envolvidos em atos que constituem crimes. Aliás, esta é a tarefa dos órgãos de defesa e segurança", disse Halaiwa.

Xitu Milongo, ativista da Plataforma Cazenga em Ação (PLACA), diz que escapou da detenção na semana passada com a ajuda da população, que o defendeu.

O ativista prevê que o novo mandato do Presidente João Lourenço será difícil para todos os que são "verticais" e criticam a governação. "Presume-se que haverá sumiços de críticos neste intervalo de cinco anos, que haja mortes misteriosas de críticos, daqueles que não se deixarem comprar pela tirania de João Lourenço."

Segundo Xitu Milongo, esses sumiços já começaram a acontecer, durante as últimas manifestações. 

Detidos há nove meses, sem acusação formal, estão dois críticos da governação de João Lourenço - Luther Campos e Tanaece Neutro.

O secretário-geral do maior partido da oposição, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), repudia estes atos. "Continuamos a apelar à libertação de Tanaece, Luther Campos e de outros presos políticos que ainda jazem nas cadeias do regime", afirmou Álvaro Chikwamanga Daniel.

O início do julgamento de Tanaece Neutro está marcado para 6 de outubro. Luther Campos começará a ser julgado a 9 de outubro.

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