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Projeto

Soraia Vilela4 de maio de 2007

Crianças de Kassel, o senegalês Kann-Si, o magazine "in situ", de Buenos Aires, ou batucadas no Acre. O NBP de Ricardo Basbaum já passou por dezenas de intervenções. Com resultados diversos e às vezes polêmicos.

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O NBP de BasbaumFoto: Ricardo Basbaum

Uma performance musical a partir da peça, uma torta para ser degustada lá dentro, os ecos do objeto na arquitetura de uma edificação imponente, um roteiro de vídeo construído a partir da ausência deste objeto e até mesmo a passagem por um hospital destinado a doentes terminais, onde o objeto NBP (Novas Bases para a Personalidade), de Ricardo Basbaum, serve como plataforma de discurso sobre vida e morte.

O objeto é a peça central do projeto Você gostaria de participar de uma experiência artística?, que o artista brasileiro desenvolve, no momento, em cooperação com a documenta 12. As variações escolhidas pelos participantes são várias e o pensar sobre a intervenção de cada um oscila do lacônico – com "zero" comentários no website do projeto – ao semi-acadêmico, como parte de um nicho prévio de reflexão, no qual o objeto é apenas incorporado a um discurso já existente ("da desconstrução", "pós-colonial", etc).

O que fazer com isso?

Em Rio Branco, o participante Zukymavoy delira com "o batuque obtido com a própria peça". Na Casa das Artes da Mangueira, no Rio de Janeiro, o NBP é revestido de verde-e-rosa e serve como tanque improvisado para lavar roupa. A artista plástica gaúcha Elaine Tedesco confessa que, de início, não sabia o que fazer com aquela "peça branca retangular, com um furo no meio, que remetia a Eu e você, também de Basbaum".

Na Cidade do México, o Laboratorio 060 também expõe a dúvida primordial, que talvez resuma a experiência do confronto com a peça: "Giramos em torno do objeto, viramos o mesmo de cabeça para baixo, ficamos olhando para ele em desespero. Poderíamos vendê-lo num mercado de pulgas e passar o problema para um comprador desavisado".

Conceitos invisíveis, mas manipuláveis

As dificuldades e os efeitos do deslocamento, a ausência de função (identidade) e o diálogo (ou não) com o outro (propositor) são alguns dos vieses que permeiam o work in progress de Basbaum. Para o artista, que dialoga no site do projeto com um possível interlocutor, interessado em "participar de uma experiência artística", o objeto carrega "alguns conceitos", que "apesar de invisíveis, são manipuláveis".

A idéia é não só utilizar a peça, como também registrar a experiência através de texto, fotografia, vídeo, som ou o que for. Em alguns poucos casos, contudo, o participante optou por tirar o objeto de circuito, como foi o caso de Jorge Menna Barreto, em Porto Alegre, ou do coletivo vaca amarela, de Florianópolis.

Recibo NBP
Participação do grupo vaca amarela, Florianópolis, 2003, no projeto de BasbaumFoto: Vaca Amaralela Group

Enquanto o primeiro optou por enterrar o objeto, eliminando-o a possibilidade de vê-lo ou tocá-lo, o segundo tirou-o de circuito, entregando-o ao Museu de Arte de Santa Catarina (MASC), mediante comprovante de recebimento. O gesto do grupo foi, na época (2003-2004), discutido em alguns blogs brasileiros e visto como uma quebra do circuito que começa no artista, passa por mediadores e termina no museu. Uma suspensão do esperado, uma irreverência que sugeria a desordem?

Regras do jogo

Ao entregar o NBP ao museu, o coletivo tirou o objeto enviado por Basbaum de circulação, o que fez com que o artista fosse a Florianópolis resgatá-lo. A intervenção "precisa e inteligente" do grupo, nas palavras do próprio Basbaum, em um fórum de discussão online, foi acompanhada de um silêncio tumular por parte do coletivo. Afinal, dizem hoje alguns dos artistas do vaca amarela, "acreditamos que a própria ação fale o suficiente".

A autonomia sobre a obra de arte, no caso, foi colocada em xeque. "Ao recebermos o NBP, tínhamos o poder total sobre ele e isso fazia parte das regras do jogo", lembram os integrantes do grupo. O coletivo, porém, subverteu as regras desse jogo, guardando cautelosamente as "cópias autenticadas em cartório" do recibo de doação da peça ao museu. Ou seja, insistindo na "legalidade" do jogo, apesar da subversão.

Corte de cordão umbilical

Mesmo com "zero" comentários no site do projeto de Basbaum, o recibo do vaca amarela foi a prova de um corte do cordão umbilical entre artista e obra. E talvez exatamente por isso é que a decisão do grupo se destaque entre outras intervenções dentro do projeto. "Doamos ao museu mais próximo, tentando antecipar o destino inevitável do objeto. Resultado: o artista resgatou o NBP do museu e o colocou para circular novamente, inclusive multiplicando o objeto", lembram os integrantes do grupo.

Depois disso, resgatados e seguros, vários NBPs já foram parar, por outros caminhos, em diversos museus mundo afora. Inclusive em Kassel, onde ficarão expostos durante a documenta 12.