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O difícil caminho da reforma política no Brasil

Fernando Caulyt31 de outubro de 2014

Tema entra mais uma vez em pauta após reeleição de Dilma, mas enfrenta resistência do Congresso, que tem que aprovar plebiscito ou referendo. Mudança pela via do Poder Judiciário é possível, mas é tida como arriscada.

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Proteste in Brasiliens Hauptstadt Brasilia
Foto: Valter Campanato/ABr

A reforma política entrou novamente em pauta após o discurso de Dilma Rousseff como presidente reeleita, no domingo (26/10). O tema, discutido há mais de 20 anos pelo Congresso, nunca avançou, ainda que, como acontece no atual governo, Fernando Henrique Cardoso e Luís Inácio Lula da Silva tivessem maioria na Câmara e no Senado.

O tema voltou à tona durante as manifestações que levaram milhões de brasileiros às ruas em junho de 2013. Uma das principais reivindicações era uma reforma política profunda e o combate à corrupção. Em resposta, Dilma acrescentou a reforma política em um dos cinco pactos que elaborou na época. Porém, a proposta não foi acolhida nem pela base de apoio da presidente.

Hoje, a reforma defendida por Dilma consiste no fim das doações de empresas privadas; voto em lista em dois turnos (primeiro numa lista de candidatos apresentados pelos partidos e, depois, num candidato específico); paridade entre homens e mulheres nas listas partidárias; e fim das coligações proporcionais (mecanismo em que partidos se aliam para eleger candidatos ao Legislativo).

Mas, de acordo com especialistas ouvidos pela DW Brasil, a reforma, por mexer com diversos interesses da classe política brasileira, não deverá sair do papel. E tanto faz se o modelo escolhido seja o plebiscito ou referendo – defendidos em entrevistas dadas por Dilma nesta semana – ou a convocação de uma Constituinte exclusiva.

Num plebiscito, os eleitores são convocados a opinar antes da elaboração da lei. A decisão entre presidencialismo, parlamentarismo e monarquia, em 1993, é um exemplo. No referendo, o Congresso faz a lei e os eleitores decidem se ela deve entrar em vigor, a exemplo do Estatuto do Desarmamento, em 2005. Já uma Constituinte exclusiva, de acordo com Dilma, seria convocada após a realização de um plebiscito.

Dependência do Legislativo

Para o cientista político Pedro Fassoni Arruda, da PUC-SP, se a reforma dependesse apenas do governo federal, seria mais fácil. Porém, é refém da correlação de forças dentro do Congresso.

E, como essa é a legislatura mais conservadora dos últimos 50 anos no Brasil, a tendência é que o tema fique somente na discussão – como está há mais de duas décadas.

"Há muita resistência de grupos poderosos no Congresso. E não existe um mínimo de consenso entre os partidos sobre o tema. Entre os exemplos, está o fato de que alguns partidos querem o fim do financiamento privado de campanhas, outros não", afirma Arruda. "E, de acordo com a Constituição, só o Congresso pode autorizar a realização de um referendo ou convocar um plebiscito. Tudo passa pela Câmara dos Deputados e o Senado."

Dilma Rousseff / Brasilien / Fernsehansprache
Em resposta às manifestações, Dilma anunciou na TV cinco pactos. Entre eles, estava a reforma políticaFoto: picture-alliance/AP

Segundo o cientista político Adolpho Queiroz, do Mackenzie, não há chances reais de a reforma sair do papel. A reforma política, para ele, não interessa aos políticos e partidos, principalmente ao PT e PMDB, que foram os grandes vencedores das eleições.

"Se o sistema permanecer como está, ele beneficia tanto partidos grandes quanto pequenos", opina Queiroz.

Pela via da Justiça

A Constituinte exclusiva seria uma das possibilidades para a realização da reforma política. Porém, não há na Constituição um artigo específico que trate sobre quem tem a competência de convocá-la. Dependendo da interpretação, isso pode ser feito pelo presidente da República ou pelo Congresso.

Numa Constituinte exclusiva, novos deputados teriam que ser eleitos somente com a função de elaborar e votar as propostas da reforma política – o que, para especialistas, pode durar mais de quatro anos. Depois da aprovação, ela seria dissolvida.

"Se a Constituinte for convocada pelo presidente da República, isso vai parecer que é uma afronta ao Congresso Nacional", diz a cientista política Christiane Romeo, do Ibmec/RJ. "Não sei se Dilma teria sustentação para isso, já que o PMDB, que define a governabilidade do país, pode pisar no freio em relação a isso."

A especialista afirma que uma reforma pela via do Poder Judiciário não é impossível, mas ao mesmo tempo arriscada. Como exemplo, o STF decidiu pela constitucionalidade da chamada "Ficha Limpa", em 2012.

Para Romeo, apesar de não ser um poder eleito e não ter legitimidade, lentamente o STF tem influenciado as políticas públicas no Brasil.

"O STF é uma caixinha de surpresas. A Dilma vai nomear mais cinco ministros e não sabemos se a instituição vai funcionar ideologicamente por causa dessas indicações ou de forma independente", avalia. "O STF pode estar vinculado ao PT e não sabemos se boas reformas virão daí."