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Mutilação genital afeta metade das mulheres da Guiné-Bissau

4 de outubro de 2012

Em junho de 2011 o parlamento guineense aprovou uma lei que proíbe a mutilação genital feminina. Mais de um ano decorrido, esta violação dos Direitos Humanos continua a afetar metade das mulheres na Guiné-Bissau.

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Trabalho de sensibilização contra a MGFFoto: Weltfriendensdient e.V.

"Não é admissível que a cultura seja utilizada como justificação para o sofrimento de parte da população", salientou o ministro da saúde do Governo de transição, Agostinho Cá, na abertura da "Conferência Islâmica para o abandono da mutilação genital feminina". Este encontro, que encerra esta quinta-feira (04.10) em Bissau, reúne especialistas e líderes religiosos. Como resultado da conferência espera-se que seja elaborada uma Fatwa (decreto islâmico) a ser lida numa das mesquitas de Bissau na sexta-feira (05.10).

Na Guiné-Bissau, segundo dados da UNICEF, há entre 300 a 500 mil meninas e mulheres que foram vítimas de uma das várias variantes da mutilação genital feminina: da clitoridectomia, excisão total ou parcial do clítoris, e nalguns casos até de infibulação, que consiste em fechar a abertura vaginal.

Envolver as fanateca, as mulheres que praticam a mutilação, e sensilizar a população é fundamental para lutar contra a mutilação genital feminina
Envolver as fanateca, as mulheres que praticam a mutilação, e sensilizar a população é fundamental para lutar contra a mutilação genital femininaFoto: Weltfriedensdienst e.V

A Fatwa seria mais um passo para que realmente termine a pratica da mutilação neste país da África Ocidental. Pois até hoje, a lei aprovada em 2011 pelo parlamento guineense não teve muitos efeitos.

Onde acontece a mutilação genital feminina na Guiné-Bissau

As comunidades onde se efetua a mutilação vivem no Leste da Guiné-Bissau, nas regiões de Bafatá e Gabú, no Norte, em Oio e Cacheu, e no Sul, em Quinara, Tombali e Bolama-Bijagós.

A mutilação é praticada nos grupos étnicos dos Fulas, Mandigas, Nalus, Susus e Beafadas, que são grupos islamizados. Ela acontece no fim da adolescência durante o ritual de iniciação chamado fanado. O fanado é um ritual de iniciação extremamente valorizado pelas comunidades islamizadas guineenses, isto apesar da excisão não ser um preceito corânico. Mas também meninas de grupos étnicos animistas, como os Balantas e os Papéis, participam nos fanados.

Segundo um inquérito realizado pela organização não-governamental guineense Sinin Mira Nassiquê, 44,5 por cento das mulheres guineenses passaram por esta prática nefasta. Mas, o número poderá atingir os cinquenta por cento "por causa de pessoas dos países vizinhos que estão a excisar as suas crianças às escondidas", afirma Domingas Gomes, presidente da Sinin Mira Nassiquê. Daí a importância de "consciencializar, de sensibilizar as populações", diz.

Fanados alternativos

Muçulmanos guineenses apoiam o fim da mutilação
Muçulmanos guineenses apoiam o fim da mutilaçãoFoto: DW

Entre 2001 e 2003 a Sinin Mira Nassiquê, que significa "olhar o futuro", na língua mandinga, com o financiamento da ONG alemã Weltfriedensdienst, levou a cabo em todo o país cinco fanados "Ki Kudjidu". Fanados alternativos que mantêm o que o ritual tem de positivo, eliminando as práticas nefastas que lhe estão associadas.

Este fanado alternativo foi suspenso por falta de financiamento. Custava anualmente cerca de 20 mil euros.

Em 2010 reiniciou-se na Guiné-Bissau uma nova campanha de luta contra a mutilação, que envolve cinco ONGs guineenses. O projeto denominado DJINOPI, que significa "vamos para a frente", é financiado pela Weltfriedensdienst e envolve toda a comunidade.

O DJINOPI prevê apoios às fanatecas (as mulheres que praticam o fanado e a mutilação genital) para que encontrem alternativas profissionais que lhes garantam um rendimento e a manutenção do prestígio social. Algumas delas são agora animadoras e trabalham nas comunidades para acabar com a excisão. Mantêm as suas insígnias e o seu papel de guardiãs da tradição, mas abandonaram a faca.

Uma prática nefasta em pelo menos 28 países africanos

Apesar do esforço global para acabar com este crime contra os direitos humanos, a mutilação genital feminina continua ser praticada em pelo menos 28 países africanos, na Ásia e no Médio Oriente.

Devido aos movimentos migratórios alastrou-se a outras partes do globo como a Europa e a América do Norte. A Alemanha, a França, o Reino Unido e Portugal não são exceção. Vivem na Europa meio milhão de meninas e mulheres que foram vítimas desta tortura. Em todo o mundo estima-se que o número de vítimas seja entre 100 a 140 milhões.

Nalguns casos corta-se o clítoris, noutros os grandes e os pequenos lábios. Uma vez concretizada, a mutilação é irreversível e se a vítima sobreviver, irá sofrer inúmeras consequências físicas e psicológicas. A curto, médio e longo prazo.

Autora: Helena Ferro de Gouveia (com LUSA)
Edição: Johannes Beck