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Justiça portuguesa "sem meios" para caso Kangamba e afins

João Carlos (Lisboa)28 de outubro de 2014

Em Portugal, até há vontade de investigar negócios duvidosos com Angola. Mas faltam meios para levar as investigações até ao fim, denuncia a Transparência e Integridade – Associação Cívica.

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Empresário angolano, Bento dos Santos KangambaFoto: cc-by-sa/Jose David Baptista de Sousa

A Polícia Judiciária (PJ) portuguesa e o Ministério Público continuam a investigar as atividades de Bento dos Santos Kangamba.

Há cerca de duas semanas, o empresário angolano foi alvo de buscas ordenadas pelo juiz Carlos Alexandre, do Tribunal Central de Investigação Criminal de Lisboa. Kangamba, sobrinho do Presidente de Angola, é suspeito de gerir um fundo milionário destinado a branquear dinheiro em Portugal.

A PJ apreendeu, entre outros bens, oito milhões de euros em dinheiro e arrestou três imóveis do general angolano. "As investigações em curso são um sinal de que a justiça está a tentar atuar, mas faltam os meios", afirma João Paulo Batalha, diretor executivo da Transparência e Integridade – Associação Cívica (TIAC).

Barreiras e "pressão política"

"Eu diria que há uma vontade da justiça, nomeadamente da Polícia Judiciária e do Ministério Público, de investigar algumas dúvidas que existem em muitos negócios envolvendo Portugal e Angola", diz Batalha. "O que não há depois são meios e a capacidade de fazer uma investigação a fundo e de traçar a origem do dinheiro."

"Há muitas barreiras a uma investigação eficaz. Apesar de haver algum esforço em fazer as investigações, elas ainda não deram em nada", constata o responsável da TIAC a propósito de outros casos inconclusivos de suspeitas de branqueamento de capitais envolvendo algumas figuras influentes da elite angolana.

João Paulo Batalha Transparência e Integridade
João Paulo Batalha, da organização Transparência e IntegridadeFoto: Transparência e Integridade

"O que temos visto é que quando há suspeitas e investigações, nomeadamente em negócios envolvendo altos oficiais angolanos, há desde logo uma pressão política muito grande por parte do Governo angolano para que essas investigações sejam travadas", comenta. "E o Governo português, infelizmente, numa atitude cúmplice, faz eco dessas pressões políticas e, embora de forma não direta, tenta também desvalorizar as investigações. Tanto é assim que nós ainda não conseguimos ter um único caso que fosse até ao fim com acusações e com um julgamento."

Qual a origem do dinheiro?

O último estudo da organização não-governamental Transparência Internacional, representada em Portugal pela Transparência e Integridade – Associação Cívica, revela que o país continua a não implementar satisfatoriamente a Convenção anti-suborno da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

Recorrendo ao relatório, divulgado na semana passada, João Paulo Batalha diz que as autoridades portuguesas têm muita dificuldade em traçar a origem dos fluxos de dinheiro entre Portugal e alguns países de língua portuguesa, nomeadamente Angola.

"É difícil garantirmos que alguns negócio feitos em África não estão a envolver subornos", afirma. "Há suspeitas de que, em vários casos, há dinheiro de empresas portuguesas que acaba nos bolsos de políticos ou de pessoas próximas do poder político, nomeadamente em Angola. E depois, como mostra o 'caso Bento Kangamba', temos uma dificuldade ainda maior em saber de que forma esse dinheiro volta a Portugal."

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Justiça mais robusta

É neste domínio que, segundo o executivo da TIAC, Portugal precisa de mais eficiência, de uma justiça mais capacitada e atuante, sem pressões políticas. Além disso, "é preciso garantir que quando há relações suspeitas elas sejam investigadas até ao fim e que oficiais estrangeiros não sejam autorizados a guardar o dinheiro dos seus roubos em empresas ou bancos portugueses."

O "caso Bento Kangamba" também está a ser investigado em França. O general angolano é igualmente suspeito de liderar uma rede de tráfico de seres humanos, branqueando os lucros em clubes de futebol. Em Portugal, segundo a imprensa lusa, o empresário foi um dos principais patrocinadores do Vitória de Guimarães.