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EUA voltam a debater pena de morte

Gero Schliess (rc) 19 de maio de 2014

Erros judiciais e uma execução malsucedida colocaram novamente a pena capital em discussão entre os americanos. Estudo indica que 4% das sentenças de morte aplicadas no país são equivocadas.

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Foto: DW/G. Schließ

SheJuan Oliphant diz não ter dúvida de que a pena de morte é necessária. Sem ela, afirma, certamente haveria mais crimes. A jovem trabalha na Texas Car Title and Payday Loan, uma empresa particular que realiza empréstimos financeiros na cidade de Huntsville, no Texas.

Huntsville ganhou notoriedade por ser a cidade onde são realizadas as execuções no Texas, estado americano que mais aplica a pena capital. No total, 1.270 pessoas já foram executadas e outras 280 aguardam a sua vez no chamado "corredor da morte". Mas SheJuan Oliphant não dá o braço a torcer. "Tenho tolerância zero com aqueles que andam por aí assassinando bebês ou famílias", afirma.

Nesse mesmo dia, uma execução estava programada. Pontualmente às 18h de terça-feira (19/05), Robert Campbell deveria ter recebido a injeção letal que poria fim à sua vida. Assim como SheJuan Oliphant, ele é afro-americano. Seus familiares já haviam chegado e aguardavam no estacionamento em frente à prisão. No último minuto, uma corte federal aceitou uma apelação dos advogados de Campbell e cancelou sua execução.

Após uma execução problemática em Oklahoma, onde um condenado agonizou por 40 minutos antes de morrer de ataque cardíaco, o debate sobre a pena de morte voltou à tona nos Estados Unidos. O presidente Barack Obama ordenou uma investigação sobre o caso.

Porta-voz do Departamento de Justiçam Criminal do Texas, Jason Clark evita qualquer comparação com Oklahoma. "Realizamos 33 execuções com [o sedativo] Pentobarbital, e não houve um incidente sequer. Não se pode comparar o Texas a Oklahoma", diz.

Libertado após 18 anos

Anthony Graves também esteve na prisão de Huntsville. A data de sua execução foi duas vezes anunciada e duas vezes cancelada. Após 18 anos de prisão, ele foi absolvido. Seu caso foi reaberto e sua inocência foi comprovada. Ele é o 138º prisioneiro a ser libertado após uma condenação à morte equivocada nos EUA.

Graves passou quase duas décadas atrás das grades, a maior parte do tempo em confinamento solitário em celas sem janela, convivendo com a perspectiva da morte e a certeza de sua inocência. Ele se diz ingênuo: acreditava na Justiça, mesmo durante os longos anos em que passou no corredor da morte. E afirma que não teria sobrevivido sem essa ingenuidade.

Gefängnis in Huntsville USA
A prisão de Huntsville, onde ocorrem as execuçõesFoto: CHANTAL VALERY/AFP/Getty Images

Inicialmente, ele não podia acreditar que a polícia, o promotor público e os juízes pudessem cometer erros de julgamento. "Sempre colaborei, 100%", diz. A acusação de que ele havia assassinado toda uma família, e posteriormente incendiado a casa onde moravam, era algo tão absurdo que ele se omitiu de fazer um esclarecimento rápido. "A simples idéia de que eu teria matado pessoas que sequer conhecia e que não me conheciam não fazia sentido", conta.

"Foi um inferno"

Quando Graves, completamente desprevenido, foi levado pela polícia para interrogatório, ficou em choque. Quando foi sentenciado à morte após meses agonizantes na prisão, não apenas a sua vida estava destruída, mas também a de seus familiares.

"Foi um inferno para a família inteira. Ninguém soube como lidar com isso. Em particular, a minha mãe, com seu filho no corredor da morte", afirma Graves.

Ele está livre há três anos e meio. Leva tempo para juntar os pedaços de sua vida. Há 18 anos seus três filhos ainda eram crianças, e agora, com mais de 20 anos, eles também já são pais. Após tanto tempo em confinamento solitário, ele tem que se acostumar novamente a aglomerações ou a conviver com os outros.

"Não sei como ele conseguiu sobreviver e é hoje um homem feliz", afirma a advogada Kathryn Kase, que conhece Graves pessoalmente. Ela é há muito tempo a diretora do grupo Texas Defenders, que luta por um sistema de Justiça mais justo e profissional no Texas.

Screenshot Anthony Graves Foundation
O website da Fundação Anthony GravesFoto: www.anthonygravesfoundation.org

Fundação Anthony Graves

Graves conheceu sua atual namorada, uma alemã, pouco após sua libertação. Com o dinheiro que recebeu como compensação pela condenação equivocada, ele inaugurou a Fundação Anthony Graves, com sede em Houston. O objetivo da instituição é providenciar tudo o que faltou a ele próprio: apoio às famílias dos condenados, treinamento de juristas e a realização de campanhas públicas. Hoje em dia, Graves é um palestrante requisitado e participa de reuniões com advogados e políticos.

O ex-promotor público do estado da Virginia Mark Erley mudou sua opinião sobre a pena de morte: "Como promotor, eu me envolvi em 36 execuções, e devo dizer que mudei minha perspectiva. Sempre fui um grande defensor da pena de morte, mas hoje em dia, não mais."

As execuções são muitas vezes falhas, afirma, se referindo não apenas ao acidente em Oklahoma, mas também aos erros nos julgamentos. De acordo com uma estimativa da Academia Nacional de Ciências, 4% das sentenças de morte são equivocadas. O número é preocupante: em todo o país, mais de três mil condenados aguardam execução.

Há três anos e meio em liberdade, Anthony Graves vem realizando uma "cruzada" contra a pena de morte, e conta o que lhe aconteceu há mais de 18 anos: "Isso poderia acontecer a qualquer um."