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Cegos na internet: entre acessibilidade e negligência

3 de junho de 2012

Tecnologias de leitura de tela e atenção à acessibilidade facilitam vida de deficientes visuais na internet. Porém muitos webmasters ainda dão prioridade ao espetáculo, em detrimento da funcionalidade.

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Linha Braille em computador para cegos
Foto: Fotolia/Lisa F. Young

Matthias Klaus encontra-se diante do monitor, suas mãos passeiam sobre o teclado, ele procura um artigo num portal de notícias da internet. Das caixas de som adiante vem uma voz que lê para ele o que se passa na tela.

Há anos, Klaus é redator de música da Deutsche Welle, e é cego. Ele tem bastante autoconfiança: apesar da cegueira realiza viagens profissionais, por exemplo ao festival anual folk de Rudolstadt, a eventos de música do mundo em toda a Europa, ou ao Eurovisão.

Matthias Klaus escreve sobre música
Matthias Klaus escreve sobre músicaFoto: DW

Quando esbarra numa cadeira que alguém distraidamente deixou no caminho, o jornalista de 40 e poucos anos xinga. Mas nunca dá a impressão de estar indefeso e perdido. Ele é um dos quase 9 milhões na Alemanha que portam uma deficiência "reconhecida". A maioria delas utiliza a web, graças a diversas tecnologias especiais e ao know-how dos programadores.

Ajuda vocal

Da mesma forma que todos os seus colegas, Matthias Klaus pesquisa na internet. Um screen reader – software de leitura de tela – traduz os scripts ocultos por trás dos conteúdos visuais. O que aparece no monitor é lido por um sintetizador de voz ou traduzido em escrita de pontos, numa linha Braille – um pad extra posicionado diante do usuário sobre a mesa, junto ao teclado normal, onde o conteúdo da página é reproduzido mais uma vez em linguagem para cegos.

Porém muito mais interessantes são os aplicativos controlados por voz, que fizeram enormes progressos nos últimos anos. Onde antes se escutava uma cantilena metálica e monótona, como num velho filme de ficção científica, hoje são utilizadas vozes de locutores de verdade, que possuem melodia e soam realmente bem agradáveis.

"Os meus locutores são Steffi e Yannick", comenta Matthias Klaus, e dá uma amostra. Que imediatamente resulta em risadas pois, em vez de "Facebook", Yannick diz "fatsebôc". "Claro que ele só é uma máquina burra e, como tal, comete um monte de erros, já que não interpreta os textos, mas sim simplesmente os lê."

Palavra-mágica: acessibilidade

No geral, contudo, trata-se de uma boa invenção, mesmo que de vez em quando o sistema de voz diga umas besteiras, opina Klaus. "Antes era preciso que alguém lesse os livros e jornais para a gente. Agora, tudo funciona sem ajuda."

Há mais de 20 anos o autor navega pela internet. Do início ao final da década de 90, a internet era mais centrada no texto – portanto não havia um problema para ele. "Mas aí vieram os scripts em linguagem Java. Passaram a se produzir na tela coisas impossíveis de representar, com os programas de leitura da época. E o Flash foi a catástrofe seguinte: foi preciso trabalhar muito tempo, até que pudéssemos ler o que era mostrado." Para tal, os programadores tiveram que suprir as animações Flash com textos completos e bem descritivos – senão, para os cegos, essas coisas simplesmente não existiam.

É uma grande ajuda quando links, comutadores e botões são rotulados. Desse modo, os vídeos no YouTube, por exemplo, fazem sentido, diz Matthias Klaus. Comando como "play" e "stop" e o tempo transcorrido tornam-se, então, visíveis. E ele pode "assistir" aos vídeos – o que, aliás, não é nada de extraordinário, pois cegos sentam-se diante da televisão e vão ao cinema.

"Os programadores só não podem esquecer: às vezes estão com pressa e não atentam como deveriam para a etiquetação. Mas muitos sites lembram que é preciso levar em consideração a acessibilidade".

Afinal de contas, ela é um conceito que representa um papel central na lei alemã de equiparação dos portadores de deficiência. Esta entrou em vigor em 1º de maio de 2002, portanto há exatamente dez anos, ocasionando numerosas modificações arquitetônicas em edifícios públicos. Da mesma forma, a norma de acessibilidade se aplica às mídias, e portanto também à internet.

Computador equipado para deficientes visuais
Computador equipado para deficientes visuaisFoto: AP

Ovelha negra

Deficientes visuais como Klaus tiram pouco proveito de sites com profusão de animações e vídeos, que talvez pareçam muito chiques. Exemplos positivos são o Spiegel online ou a página de busca do Google, adaptados de maneira excelente para cegos. "No Google, pode-se saltar de um resultado para outro com uma única tecla, coisa que outras máquinas de busca não permitem. Nelas é preciso ler cada linha, também o bla-bla-blá que não interessa a você."

Péssima é sua avaliação do Facebook. É impossível ler a versão WWW, devido ao volume de publicidade e outras coisas inúteis para quem não vê. Por isso, a maior parte dos cegos não gosta da rede social, revela Matthias Klaus. "Quando entro no Facebook, utilizo a versão para celular, que tem muito menos conteúdo [desnecessário]."

Afinal: "Quem pensa que tem que mostrar uma imagem a 100 amigos cegos devia, antes, contar uma história. Na vida real, ninguém mostra mesmo fotos para nós".

Assim, para ele as redes sociais não são tão interessantes, quando se trata de manter contato com os amigos. Matthias Klaus continua fiel às boas e velhas listas de mailing. Uma pessoa escreve algo e todas as outras podem ler e responder, de forma que todos os outros também veem. "Não é nada mais do que Facebook, mas de forma que se pode ler."

Autor: Silke Wünsch (av)
Revisão: Carlos Albuquerque