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"Dança do gaúcho" causa mais alarde na Alemanha do que fora

Fernando Caulyt / Greta Hamman16 de julho de 2014

Na festa do título em Berlim, jogadores usaram versão de música comum nos estádios de seu país para ironizar argentinos. Atitude causou indignação na imprensa alemã, que diz que imagem deixada no Brasil ficou arranhada.

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Foto: Alex Grimm/Bongarts/Getty Images

Os alemães deixaram uma boa impressão na Copa. Foram cordiais com o povo quando tiveram a chance, e leais com seus adversários mesmo nos momentos mais delicados, como na goleada de 7 a 1 no Mineirão. A imagem quase impecável deixada, que fez muitos brasileiros torcerem por eles na decisão, parece agora levemente arranhada. Ainda que mais dentro da própria Alemanha do que fora.

Tudo por conta de alguns minutos da festa da vitória em Berlim, nesta terça-feira (16/07). Precisamente quando Mario Götze, Miroslav Klose, Toni Kroos, André Schürrle, Shkodran Mustafi e Roman Weidenfeller subiram ao palco montado em frente ao Portão de Brandemburgo e ironizaram os argentinos diante de 400 mil torcedores.

"Assim caminham os gaúchos, assim caminham os gaúchos", cantavam os jogadores alemães abraçados, enquanto avançavam com o corpo curvado para frente. Depois, já com as costas eretas, entoavam: "Assim caminham os alemães, assim caminham os alemães."

A música não raro é entoada entre torcedores de clubes da Alemanha em celebrações de vitórias. Mas recebeu uma enxurrada de críticas da imprensa alemã, que viu nela um deboche desnecessário – aceitável por parte de torcedores de clubes, mas não por parte de representantes de um país.

Enquanto a mídia argentina deu pouca atenção ao assunto, limitando-se a noticiar a polêmica aberta na Alemanha, sites de jornais e revistas alemães usaram expressões como "falta de respeito", "ideia estúpida", "burra" e "antidesportiva" para descrever o que passaram a chamar de "dança do gaúcho".

"Gauchogate"

A repercussão também foi grande nas redes sociais. Com o hashtag #gauchogate, muitos usuários do Facebook e do Twitter criticaram a atitude. Alguns afirmaram que a dança era de muito mau gosto e que os alemães esqueceram o que fizeram no Brasil, em alusão à cordialidade dos jogadores durante a Copa.

Para o jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung, a celebração da vitória no Portão de Brandemburgo foi um "gol contra gigante". O jornal afirmou também que a ironia com o adversário na final da Copa sujou a imagem de "uma nação tolerante e aberta ao mundo" que a Alemanha tentou deixar com o seu quarto título mundial.

A maior revista alemã, Der Spiegel, também criticou a atuação de alguns dos jogadores no palco em Berlim. "Não foi muito agradável: em plena euforia, alemães famosos internacionalmente zombaram da Argentina derrotada na final", afirmou em seu site. "Parece que a festa não fez bem para alguns."

O jornal Tagesspiegel considerou a dança do gaúcho "de mau gosto" e "que deixou para trás a modéstia alemã". Para a publicação, a alegria por vencer a Copa não foi suficiente. "Só se acha satisfação quando se zomba um pouco dos perdedores sofredores." Para o diário, no final, a dança deve ficar como marca na cabeça de muitas pessoas de fora da Alemanha. "Eles não fizeram por mal. Mas eles comprovaram que também no futebol não só existem idiotas, mas também grandes idiotas."

Fußball WM 2014 Empfang Nationalmannschaft in Berlin
Para revista "Spiegel", alemães também ironizaram o Brasil ao "entrar em campo" como a SeleçãoFoto: picture-alliance/dpa

O Tageszeitung (taz) escreveu que houve "falta de respeito na comemoração perante o rival", enquanto o Die Welt afirma que a "dança do gaúcho" foi uma "ideia estúpida" e que faltou modéstia aos jogadores, como se os gaúchos derrotados não merecessem mais respeito. O Bild, jornal mais lido da Alemanha, dedicou várias páginas à festa em Berlim e colocou uma foto da encenação numa página com as "danças mais divertidas" dos jogadores.

A revista Der Spiegel também interpretou como uma ironia ao Brasil quando outro grupo de jogadores alemães, formado por Bastian Schweinsteiger, Manuel Neuer e Benedikt Höwedes, subiram ao palco em fila e com a mão no ombro do companheiro da frente – forma como o Brasil entrou em campo até a derrota para a Alemanha na semifinal.

Na Argentina, pouca polêmica

Na Argentina, as críticas partiram de alguns poucos articulistas. Como o jornalista esportivo Victor Hugo Morales, que criticou de forma radical a dança gaúcha dos alemães em seu programa numa rádio de Buenos Aires. Ele descreveu os alemães como "nazistas nojentos". Usuários mais exaltados no Twitter chegaram a usar também o mesmo termo em comentários ácidos no microblog.

Fußball WM 2014 Empfang Nationalmannschaft in Berlin
Mais de 400 mil torcedores recepcionaram a seleção tetracampeã no Portão de BrandemburgoFoto: picture-alliance/dpa

Já o jornalista José Esses, autor de um livro sobre a atual carência de títulos da seleção argentina, considerou a dança inofensiva. "Logo após a final, alguns argentinos estão talvez um pouco sensíveis. Qualquer um que conhece um pouco do futebol argentino considera isso uma brincadeira de criança."

Num artigo de opinião no jornal Olé, uma jornalista alemã baseada na Argentina questionou: "Por que há a necessidade de humilhar um adversário assim?" Para ela, a Argentina jogou muito bem e se mostrou como uma boa perdedora depois de uma partida muito igual. Ela explicou no artigo, porém, que se trata de uma canção conhecida nas torcidas alemãs e que é adaptada para qualquer adversário. "Depois do 3 a 2 contra Portugal na Eurocopa de 2008, os torcedores cantaram: 'Assim caminha Ronaldo, assim caminha Ronaldo'."

O presidente da Federação Alemã de Futebol (DFB), Wolfgang Niersbach, lamentou a irritação causada. Ele afirmou que soube por Oliver Bierhoff, diretor esportivo da DFB, que a ideia dos jogadores surgiu de forma espontânea por conta da emoção do momento de comemoração.

"Eles são esportistas absolutamente respeitáveis e justos, que não queriam fazer brincadeira de mau gosto com ninguém, mas simplesmente se divertir com os torcedores. Sinto muito se alguns nos entenderam de forma errada", afirma Niersbach, que enviou uma carta de esclarecimento à federação argentina.