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Críticas contundentes à adesão da Guiné Equatorial à CPLP

António Rocha17 de julho de 2014

A inclusão da Guiné Equatorial na recém-constituída Confederação Empresarial dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (16.07) é um passo no caminho para a adesão à CPLP. Uma perspectiva que não agrada a todos.

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Foto: Paulino Tavares

Como um dos seis membros fundadores da Confederação Empresarial dos PALOP (os outros são Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe), a Guiné Equatorial deu o primeiro passo para a integração na comunidade dos falantes de português. Por parte de Malabo Equatorial, aprovaram os estatutos e elegeram os corpos sociais a Câmara Oficial de Comércio de Bioko e a Câmara Oficial de Comércio de Rio Muni.

O Presidente, Teodoro Obiang Nguema, há muito que se empenha pela adesão do seu país à CPLP. O maior obstáculo a esta adesão foi a situação dos Direitos Humanos naquele país, considerada em falta. Mas a adesão deverá quase certamente ser oficializada na cimeira da CPLP marcada para os dias 22 a 25 de Julho em Díli, capital de Timor-Leste.

Um regime ditatorial corrupto

Para o diretor executivo da Organização Não Governamental (ONG) portuguesa "Transparência e Integridade - Associação Cívica" (TIAC), João Paulo Batalha, a integração da Guiné Equatorial nesta confederação dos PALOP é uma demonstração da política de aproximação que os países africanos de língua portuguesa têm feito em relação a Malabo: “A Guiné Equatorial não é, nem nunca foi, um país de língua portuguesa”. Para este analista, o país é “um dos regimes ditatoriais e mais brutais e mais corruptos do mundo “.

João Paulo Batalha Transparência e Integridade
João Paulo Batalha, director executivo da TIACFoto: Transparência e Integridade

Em entrevista à DW África, João Paulo Batalha lembra ainda que Malabo está a ser alvo de pressões da Justiça na França e nos Estados Unidos da América, “onde bens da família presidencial já foram, inclusive, apresados pela Justiça”.

E o especialista tem uma explicação para o acolhimento da Guiné-Bissau pela CPLP: “Claramente a Guiné Equatorial está à procura de outros parceiros estratégicos que lhe dêem a legitimidade internacional, que tem estado a perder. Aquilo que registamos é que, quer os PALOPs, quer a CPLP no seu todo, aprestam-se a emprestar esta legitimidade internacional, a troco de facilidades na exploração das riquezas petrolíferas da Guiné Equatorial”.

Sociedade civil dos oito países da CPLP discorda da adesão

A adesão prevista da Guiné Equatorial à CPLP na próxima cimeira da organização será feita à revelia da sociedade civil nos oito países onde se fala português, e ignorando as inúmeras iniciativas contra, levadas a cabo por muitas ONG nacionais e internacionais. Também João Paulo Batalha, assume que esta pressão da sociedade civil não demoverá os líderes da CPLP porque ”os ministros dos Negócios Estrangeiros já recomendaram formalmente esta adesão e tudo parece encaminhado para que ela aconteça”.

Teodoro Obiang Nguema
O Presidente da Guiné Equatorial,Teodoro Obiang Nguema, quer que o seu país adira à CPLPFoto: AP

O analista realça que não é por acaso que o presidente da comissão organizadora da cimeira é o ex-chefe da diplomacia portuguesa, Luís Amado, “que é também presidente de um banco, o Banif, que já anunciou um investimento na Guiné Equatorial do seu capital. Ou seja, tudo parece já estar cozinhado pelos políticos e por alguns agentes económicos para que esta adesão se faça”.

Mas, remata, não há a menor dúvida que é uma adesão que se faz contra as expetativas e os desejos da sociedade civil dos países lusófonos: “Nós temos a noção, como cidadãos dos países de língua portuguesa, que a CPLP foi fundada como comunidade para o desenvolvimento social partilhado destes países, e para a política cultural no sentido dos princípios fundadores da CPLP, que eram a defesa dos valores democráticos, a defesa das liberdades individuais, no respeito pelos Direitos Humanos, e da transparência, da boa governação e do combate à corrupção”.

O triunfo do princípio do negócio

O diretor executivo da TIAC lamenta que as objeções da sociedade civil sejam puramente ignoradas: “quando vemos a cimeira a ser preparada por pessoas directamente implicadas em negócios com a Guiné Equatorial e beneficiarem destes negócios. O que vemos é que triunfou o princípio do negócio sobre os princípios que fundaram a CPLP”.

Erdöl in São Tomé und Príncipe
Os negócios do petróleo movem os reponsáveis na CPLP a aceitar a Guiné Equatorial. acusam os críticosFoto: DW/R. Graça

O analista lembra que também na CPLP há países produtores de petróleo, com destaque para Angola, cujo Presidente, José Eduardo dos Santos, é o mais “entusiasta promotor em criar na CPLP não uma comunidade de povos, nem uma comunidade de cooperação entre países, mas sim uma espécie de cartel de barões do petróleo, que usarão a sua influência energética no plano internacional para fins de negócios e que estão aliados a muitas suspeitas de corrupção e de enriquecimento ilícito”.

Consequências económicas nefastas

Também para muitos outros observadores no espaço lusófono, a entrada da Guiné Equatorial como membro de pleno direito na CPLP é a capitulação da comunidade lusófona perante os interesses petrolíferos e os interesses de ditadores como Teodor Obiang ou José Eduardo dos Santos. É também a capitulação perante os interesses de todos aqueles que agem como facilitadores desses negócios como é o caso do governo português, diz João Paulo Batalha, e acrescenta: “Deixamos de ter espaço para a sociedade civil, mas deixamos de ter espaço também para as empresas que são realmente empreendedoras, que querem jogar no mercado, que querem criar empregos e querem desenvolvimento partilhado e prosperidade partilhada na CPLP”

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Entretanto, o Governo timorense anunciou que os Presidentes de Angola, José Eduardo dos Santos, e do Brasil, Dilma Rousseff, vão estar ausentes da cimeira da CPLP no próximo dia 23. Segundo o Ministério dos Negócios Estrangeiros timorense, o chefe de Estado angolano vai ser representando pelo vice-presidente, Manuel Domingos Vicente, e a Presidente brasileira pelo ministro de Estado das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo Machado.

O ativista João Paulo Batalha faz a sua leitura sobre a ausência dos dois Estadistas: “Mesmo os maiores proponentes desta adesão têm, apesar de tudo, alguma vergonha, ou algum pudor, em associarem-se a ela. E, aliás, isso é notório no posicionamento de todos os países da CPLP. Apesar de se encaminharem para aceitarem esta adesão, têm alguma dificuldade, e, diria mesmo, alguma vergonha, em dar a cara por ela. E, portanto, acho sintomático que os presidentes José Eduardo dos Santos e Dilma Roussef não querem assumir a decisão que tomaram, porque não é uma decisão que os possa deixar de bem com a sua própria consciência."

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