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Circulação de armas ilegais põe Europa em alerta

Erin Conroy, de Paris (av)20 de janeiro de 2015

Atentados terroristas recentes na França colocaram em evidência o mercado negro de armamentos militares, que podem ser comprados sem grande dificuldade. Antiga Iugoslávia é citada como uma das principais fontes.

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Foto: Fotolia/Haramis Kalfar

Vários fuzis do tipo kalashnikov foram encontrados em batidas antiterrorismo em diferentes locais da União Europeia (UE) nos últimos dias. O bloco vem tentando determinar onde os autores dos atentados em Paris conseguiram seu armamento, de categoria militar.

Enquanto isso, crescem os temores de que o espaço Schengen, onde não há controles de fronteiras, possa estar inundada desses fuzis. Quatro rifles de assalto do tipo foram achados num apartamento em Verviers, no leste da Bélgica, na semana passada. Durante a batida, dois suspeitos foram mortos após abrir fogo contra os agentes de segurança.

Pouco antes do tiroteio, jornais belgas noticiavam que o extremista islâmico Amedy Coulibaly comprara suas armas automáticas por menos de 5 mil euros na estação ferroviária de Bruxelas Gare du Midi, terminal do trem de alta velocidade Eurostar no país. Coulibaly foi o autor do sequestro num mercado kosher de Paris, em que matou quatro reféns.

Segundo a polícia, um traficante de armas conhecido se apresentou, alegando que estivera em contato com Coulibaly nos últimos meses e lhe vendera um automóvel. Pouco depois, os policiais encontraram documentos e outras provas de uma venda de armas.

A polícia da França também descobriu uma casinha de subúrbio recentemente alugada por Coulibaly, que era utilizada como depósito para um arsenal de armas, que incluía três AK-47s de modelo recente e um lança-granadas com propulsão por foguete.

Redes subterrâneas

À medida que os investigadores vão ligando os pontos para determinar a origem das armas, especialistas asseguram não ser surpresa que extremistas inclinados a realizar atentados tenham conseguido pôr as mãos em equipamento militar.

"Sabemos que essas armas não se encontram em cada esquina, mas se alguém quiser obter uma e tiver contatos razoáveis nos meios criminosos, não seria, em absoluto, um problema insuperável", afirma Nic Marsh, pesquisador do Instituto de Pesquisa da Paz de Oslo que publicará em breve um estudo sobre o tráfico ilegal de armas na Europa.

Libyen Aufständische Kämpfen in Ras Lanuf
Lança-granadas-foguete na LíbiaFoto: picture alliance/dpa

Ele parte do princípio que os fuzis foram comprados de narcotraficantes ou do crime organizado. O vendedor provavelmente não sabia da finalidade pretendida e não era especializado em fornecer armas para extremistas políticos.

"É comum a antiga Iugoslávia ser citada como local de origem, pois armas remanescentes das guerras caíram em mãos privadas. É possível se investir umas centenas de euros numa delas na Bósnia e então vendê-la por alguns milhares em algum lugar como França, Bélgica ou Holanda", explica Marsh. "É um negócio."

Desafio de controlar

Rifles automáticos podem ser fáceis de obter na UE, mas não são necessariamente populares. Embora sejam empregados em assaltos a bancos, eles representam uma percentagem mínima do equipamento que transita ilegalmente pelo bloco europeu – apenas algumas dezenas.

Isso possivelmente se deve ao fato de os criminosos preferirem armas menores, mais fáceis de esconder, transportar e usar. Custando entre 1 mil e 3 mil euros cada um, rifles automáticos são raramente usados para matar.

Claude Moniquet, codiretor do Centro Europeu de Estratégia e Segurança, na capital belga, concorda quanto à probabilidade de as kalashnikovs provirem dos Bálcãs, de onde é fácil importá-las. Segundo Gilles de Kerchove, coordenador para antiterrorismo da UE, outras podem estar vindo da Líbia.

"É um verdadeiro desafio, mas pode-se tentar impedir o tráfico de armamentos o máximo possível, sem se tornar uma sociedade totalitária", comentou à agência de notícias AFP.

Amedy Coulibaly
Amedy Coulibaly aparece em vídeo acompanhado de um fuzil semiautomático VZ-58 CompactFoto: Reuters

Para além da UE

O Reino Unido também registra o ingresso ilegal de armas dessas regiões. A ministra britânica do Interior, Theresa May, declarou à Câmara dos Comuns, que os Estados-membros da União Europeia "precisam colaborar para inutilizar os vastos números de armas dos países da ex-Iugoslávia e para coibir o fornecimento de outras partes do mundo, especialmente do Norte da África".

Antes de tomar de assalto o mercado kosher em Paris, Amedy Coulibaly fez um vídeo em que se vê um fuzil de assalto a seu lado. Peritos o identificaram como um VZ-58 Compact semiautomático, de fabricação tcheca. Há cerca de 30 em circulação no mercado armamentista clandestino, ele custa aproximadamente o mesmo que uma kalashnikov.

Como esse tipo de arma geralmente é comprado e vendido várias vezes, deverá ser bem difícil traçar sua proveniência exata, avalia Nic Marsh, do Instituto de Pesquisa da Paz. Quase certo, ressalva, é que ela não tenha sido trazida recentemente "lá longe, de Praga".

Em dezembro de 2014, os ministros do Interior da UE e seus homólogos dos países balcânicos esboçaram um plano de ação para combater o tráfico armamentista ilícito entre a UE e o sudeste europeu. Agora a UE está também considerando estabelecer um esquema semelhante com a África do Norte.

Cifras exageradas

Ainda assim, Marsh afirma serem enganosas as afirmativas de que a França estaria invadida por armas do mercado negro – fala-se de 10 milhões a 20 milhões de unidades.

De acordo com as normas francesas vigentes, alguns tipos de armas de fogo – por exemplo, espingardas carregadas manualmente – só devem ser registradas no ato da compra. Geralmente quem faz isso é o vendedor, e o proprietário não tem que registrar todo o equipamento em sua posse. Isso significa que muitas armas não cadastradas do país foram adquiridas legalmente.

Kalaschnikow oder AK 47 liegt in einer Wiese
Kalashnikov ou AK 47: uma invenção russa legendáriaFoto: picture alliance / united archives

Nic Marsh também questiona a estimativa do Ministério francês do Interior, apoiada em cifras de 2010, de que haveria 4 mil fuzis militares automáticos em circulação: "Ela é feita totalmente com base em apreensões, que oscilam grandemente de ano para ano."

O colaborador do Instituto de Pesquisa da Paz de Oslo enfatiza que armas ilegais não são usadas em grande escala na França para cometer homicídios. No geral, a taxa de mortes por armas de fogo no país é uma das mais baixas do mundo, mantendo-se entre 100 e 150 por ano.