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Cientistas querem esterilizar mosquitos para combater doenças

Kerry Skyring8 de agosto de 2014

Pesquisadores da Agência Internacional de Energia Atômica estão ocupados com a vida sexual dos mosquitos para prevenir doenças como a malária.

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02.07.2014 DW FIT UND GESUND Mücke
Foto: Fotolia

O sol está se pondo e os mosquitos estão saindo. Eles têm duas coisas nas suas pequenas cabeças – comida e sexo. Aqui está uma descrição bastante sutil, para menores de 18 anos, sobre o que geralmente acontece.

A fêmea entra no enxame. Um macho a procura. A velocidade da batida das asas diminui até que ele a encontre. Usando suas longas patas dianteiras, ele agarra as patas traseiras da fêmea e se move sob seu abdome.

Em menos de um segundo, os amantes estão conectados. Eles voam lentamente, à meia altura, pelo enxame. A cópula inteira pode levar menos de 16 segundos.

O ambiente

No laboratório de Siebersdorf, perto de Viena, na Áustria, cientistas da Agência Internacional de Energia Atômica estão se tornando intimamente familiarizados com a vida sexual dos mosquitos.

Eles criam insetos e os submetem a radiações até que se tornem estéreis. Assim, eles estariam prontos para serem libertos na natureza. A atmosfera é de uma espécie de férias no Caribe no ambiente do laboratório: quente e úmido.

O entomologista Jeremie Gilles aponta bastante orgulhoso para a caixa onde estão os insetos.

"Eles estão em um ambiente bastante calmo e relaxado. Existem alimentadores com açúcar e machos e fêmeas estão nas caixas. As fêmeas vão a lugares como estes, após alimentarem-se de sangue, para desovarem", explica o pesquisador.

Os machos gostam de açúcar. As fêmeas preferem o sangue quente de humanos ou animais. No laboratório, apenas os machos serão esterilizados.

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Área do projeto de esterilização de mosquitosFoto: Kerry Skyring

"É claro que nossos alvos são os machos porque nós não podemos libertar as fêmeas. Isto é muito importante porque os mosquitos fêmeas, além de serem incômodos, também transmitem doenças. Então nós libertamos somente os machos", diz Jeremie.

Cenário de morte

A reportagem se desloca por um labirinto de salas onde são realizados experimentos com reprodução em massa. É como se fossem orgias de mosquitos nutridas com sangue e açúcar, se você assim preferir descrever.

"Pelo fato de nós não podermos ser picados todo tempo, nós temos de desenvolver alguma estratégia para dar sangue aos insetos. Então nós coletamos o sangue de matadouros e frigoríficos", revela Jeremie.

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Jeremie GillesFoto: Kerry Skyring

A reportagem preferiu também não correr o risco de ter o próprio sangue doado para a experiência ou colocá-lo a disposição das fêmeas insaciáveis.

Conforme a Organização Mundial de Saúde, a malária mata mais de 600 mil pessoas todos os anos e debilita um número ainda maior.

A maioria das pessoas que contraem malária são crianças com menos de cinco anos que vivem na África subsaariana.

A malária é a principal causa de morte em Angola e provocou no primeiro semestre deste ano 171 óbitos somente na província de Benguela, no litoral sul. Conforme técnicos do Programa de Combate à Malária, comparativamente a período igual de 2013, registou-se um aumento de mais 54 casos.

A redução destas mortes parece ser motivo mais que suficiente para esterilizar os mosquitos. No entanto, o pesquisador Andrew Parker também tem outra razão.

"Se nós conseguirmos atingir a erradicação local, não global, mas a remoção local das espécies, então é claro que não precisaremos de pesticidas. Então a tecnologia pode favorecer bastante a redução substancial do uso de pesticidas", afirma Parker.

A mutação

Nesta batalha global contra os mosquitos e as doenças que eles espalham, inseticidas são libertados ao ar com latas de aerosol, tratores e até mesmo motocicletas.

Nos países desenvolvidos, onde o risco de transmissão destas doenças é baixo, a prática garante um vida mais confortável. Entretanto, na África, onde o Dr. Abraham Mnzava trabalha no controle da malária para Organização Mundial de Saúde, estes métodos podem salvar vidas.

"Nos países onde a transmissão é bastante alta, eu acho que por um longo tempo as pessoas ainda continuarão confiando no uso de inseticidas, especialmente para o tratamento de mosquiteiros", revela Mnzava.

Um desafio aos pesquisadores da área é a resistência aos fármacos pelo parasita que causa a malária. Tal resistência estendeu-se a várias regiões do sudeste asiático, o que ameaça "seriamente" os programas globais de controle da doença.

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Mosquito asiáticoFoto: picture-alliance/dpa

A resistência à artemisina, principal tratamento contra a malária, generalizou-se nesta região depois de ter sido detectada pela primeira vez em 2005 no oeste do Camboja, onde anteriormente também foram detectadas resistências a outros tratamentos atualmente em desuso.

A investigação, publicada na revista "New England Journal of Medicine", analisou 1.241 pacientes da estirpe mais perigosa do parasita em dez países da Ásia e África, e detectou uma resistência "estabelecida" no oeste e norte do Camboja, Tailândia, Vietname e leste da Birmânia.

Conforme o pesquisador Jeremie, os mosquitos tornam-se cada vez mais resistentes aos inseticidas e também mudam seus hábitos.

"Estão surgindo evidências de que estes mosquitos picam de manhã cedo, mesmo antes das dez da manhã. Nesta hora, as pessoas não estão protegidas pelos mosquiteiros. Então nós precisamos de novas ferramentas", constata Jeremie.

Usar mosquitos em mosquitos

Voltando a Seibersdorf, a doutora Cynthia espera que a pequena escala de encontros envolvendo fêmeas e machos seja base para algo muito maior.

"Esperamos fazer isto em larga escala e assim liberarmos uma grande quantidade de machos esterilizados. Se tudo correr bem, nós seremos capazes de ver uma queda drástica no número de pessoas que sofrem com doenças transmitidas por mosquitos", espera Cynthia.

Mas, para causar um impacto importante nestes números, milhões de machos esterilizados deverão ser espalhados pelas zonas problemáticas. Isto representa um desafio para Jeremie e seus colegas de pesquisa.

"No momento nós estamos trabalhando com este aspecto, mas nós nunca tentamos e nós estamos aprendendo a trabalhar com aviões leves ou ultraleves. Agora mesmo estávamos começando a falar no uso de drones, aviões não pilotados", explica.

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Pessoa doente com dengueFoto: picture-alliance/dpa

Quem é o melhor?

Portanto, ao invés de usar aeronaves para espalhar produtos químicos na atmosfera para eliminar os insetos, eles irão liberar mosquitos. Será essa a lógica da equipe de pesquisadores?

Jeremie responde que sim. "Nós queremos espalhar mosquitos. Por isso, esta é a melhor alternativa aos inseticidas."

A reportagem chega a outro lugar quente e úmido. Uma nova cena de sexo. Os cientistas precisam descobrir se os mosquitos esterilizados ainda atraem os mosquitos do sexo oposto.

Jeremie explica que um macho é pego na natureza, levado ao laboratório e colocado junto com um macho esterilizado para competir por uma fêmea trazida do mato também. "Então você vê quem será o melhor. Esta é a forma de testar a qualidade do nosso produto, dos machos esterilizados."

Os cientistas não são os únicos que têm tentado acabar com o problema dos mosquitos.

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Lugar de reprodução dos mosquitosFoto: WHO/J. Gusmao

Até mesmo a Walt Disney chegou a mirar os pequenos insetos. Na década de 40, produziu um desenho animado para educar as crianças norte-americanas sobre os perigos dos mosquitos.

Mas eles continuam com seu zumbido e suas picadas. E as pessoas continuam usando inseticidas. Os cientistas do Seibersdorf acreditam que isto permanecerá assim até a técnica da esterilização de mosquitos começar a fazer algum efeito nas populações de insetos.

Até lá, portanto, a alternativa aos inseticidas e mosqueteiros continua a ser um tapa para acabar com o zumbido irritante.