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"Brasil não impôs acordo final", diz embaixador

23 de junho de 2012

Embaixador Corrêa do Lago rebate acusação de delegações sobre documento adotado ao fim da conferência e ressalta multilateralismo. Manchetes que associam resultado a "fracasso" também foram vistas na Eco92, lembra.

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Foto: Reuters

Algumas delegações deixam o Rio de Janeiro dizendo que não houve espaço para negociação na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, encerrada nesta sexta-feira (22/05). O negociador-chefe da delegação brasileira, André Corrêa do Lago, nega as acusações. Segundo o embaixador, o Brasil, que chefiou as negociações na reta final, respeitou o multilateralismo.

A Conferência do Clima de Copenhague, em 2009, deixou a ideia de que os documentos tinham que ser negociados sob uma pressão brutal, com a presença de chefes de Estado. Na verdade, disse Corrêa do Lago, o Brasil restaurou o processo normal das conferências da Organização das Nações Unidas (ONU), ou seja, fechando o documento final antes da chegada dos líderes.

Deutsche Welle: Alguns países deixam a Rio+20 acusando o Brasil de ter imposto um texto no último momento. É verdade?

André Corrêa do Lago: Isso é impossível no multilateralismo, porque a grande força de uma reunião como essa é que nenhum país pode impor o que quer que seja, tudo tem que ser aprovado por consenso. Ou seja, todos os países têm que estar de acordo.

O que aconteceu foi que, depois de passar vários meses analisando o documento, o Brasil fez uma proposta aos demais países no momento em que lhe foi passada a coordenação das discussões. O Brasil propôs um texto, que foi analisado pelas várias áreas. E as pessoas pediram coisas, mudanças. O Brasil ouviu o pedido de todos os países, levou-os em consideração e procurou fazer as alterações que assegurassem que o documento fosse equilibrado. E essa foi a conclusão de todos os países-membros: o documento estava equilibrado e, portanto, podia ser aprovado daquela forma.

Há uma coisa muito importante: é evidente que nenhum país está plenamente satisfeito com o documento porque não é um documento de um país apenas, mas reúne a concordância de 193 países.

Depois da conferência de Copenhague [Conferência do Clima de 2009], ficou para toda uma geração uma percepção de que os documentos tinham que ser negociados sob uma pressão brutal, com a presença de chefes de Estado. E foi a primeira vez que isso aconteceu. As Metas do Desenvolvimento do Milênio da ONU foram definidas numa cúpula em Nova York, com o documento já pronto e acordado por todos os países. O que o Brasil fez na Rio+20 foi simplesmente voltar ao modo como normalmente transcorrem as conferências da ONU. No nível técnico e no nível ministerial, porque havia ministros presentes, esse documento foi acordado e oferecido às delegações, que o aceitaram.

É inevitável comparar os resultados dessa conferência com os da Eco 92, e a sensação de frustração é grande. Como a Rio+20 será lembrada nos próximos 20 anos?

Acho que, daqui a 20 anos, as pessoas vão ficar muito impressionadas com a maneira como essa conferência tocou nos pontos mais importantes sobre os quais precisamos pensar para o futuro, com o estabelecimento muito claro das prioridades. Em primeiro lugar, vem a erradicação da pobreza e, em segundo, a mudança de padrões sustentáveis de produção e consumo. Isso é um sinal de que o mundo concorda com a necessidade de mudarmos nossa forma de desenvolvimento e, por isso, esse é o grande apoio que o documento dá à implementação efetiva do desenvolvimento sustentável.

Para isso, criamos os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, que irão orientar essa mudança. Também aprovamos no Rio o plano de dez anos para os padrões sustentáveis de produção e consumo.

Outro dia, fizemos um exercício aqui de rever os jornais publicados logo depois da Eco92. E as palavras mais frequentes são "decepção", "documento fraco", etc. Então, achamos natural essa reação pós-Rio+20. Agora, acho que a reação da sociedade civil é muito importante: ela tem que continuar a reclamar e a pressionar os governos. A sociedade civil está sempre à frente, vendo as coisas acontecerem, e os governos têm que atuar em função do que está acontecendo. Espero que uma maior ação da sociedade civil seja algo de que nos lembremos no futuro quando falarmos da Rio+20.

A Rio+20 polarizou mais uma vez ricos e pobres?

Acho que não polarizou mais. A grande diferença é que, em 1992, ainda havia uma impressão de que certos países tinham seguido um caminho certo, e que o mundo deveria se unir para ajudar os demais países a seguirem um caminho similar.

Hoje, nessa conferência, vemos um texto muito mais contemporâneo, que mostra não existir mais caminhos certos. Vários países encontraram rotas diferentes no caminho do desenvolvimento sustentável.

Esse reconhecimento de que não há um modelo para todo mundo, de que há formas de se responder aos desafios do desenvolvimento sustentável dependendo das condições dos países, dependendo das circunstâncias naturais dos países torna o documento que sai daqui extraordinariamente contemporâneo.

Entrevista: Nádia Pontes, do Rio de Janeiro
Revisão: Luisa Frey