1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Berlim se descobre como metrópole gastronômica

Katherine Sacks (nm)14 de outubro de 2014

Mercados de rua, degustações, festivais: embora modesta, a capital alemã é plena de eventos, novidades e surpresas em gastronomia e culinária. Internacional, sem dúvida, mas com lugar para o regional e no tradicional.

https://p.dw.com/p/1DTCk
Foto: Ralph Bergmann

Desde o anárquico início dos anos 1990, logo após a queda do Muro, Berlim se transformou muito. Quem se mudou recentemente para lá, costuma reclamar que chegou tarde demais: tarde para os aluguéis ultra baratos ou para viver a autêntica vida boêmia, antes de a aristocratização começar a invadir a metrópole.

Por outro lado, quem gosta de comer bem – ou seja, de comida deliciosa e bem variada –, não tem do que reclamar. Para esses, os últimos anos foram o momento certo para chegar à capital alemã.

Inovações gastronômicas

A consultora de culinária Cathrin Brandes se mudou para Berlim no começo da década de 1990, pouco depois da queda do Muro e da reunificação da Alemanha. Na época, segundo ela, a cena gastronômica era desoladora. Os restaurantes na zona ocidental eram tradicionais e conservadores, e o bairro oriental de Mitte, hoje uma das áreas de maior oferta culinária, estava completamente vazio.

Mas, graças ao turismo, aos novos restaurantes e às startups, a gastronomia de Berlim se desenvolveu. Foi justamente esse clima de inovação, envolvendo tanto entusiastas da tecnologia quanto da boa comida, o que levou Jörn Gutowski a escolher Berlim como local para seu negócio.

Berlin Food Week EINSCHRÄNKUNG
Gastronomia ganha com o empreendendorismo de BerlimFoto: Ralph Bergmann

Sua Try Foods oferece sets para degustação de determinados ingredientes – como pimenta, sal, café, chocolate ou azeite –, em diversas variações e acompanhados de explicações sobre a história do produto.

Quando Gutowski chegou em Berlim em 2003, ele vivenciou o mesmo deserto culinário descrito por Cathrin Brandes, sem nenhuma opção de restaurantes em seu bairro, Friedrichshain. "As pessoas não saíam para comer, mas sim, comiam para sair. Comer era algo que você tinha que fazer antes da noitada, de forma a estar 'forrado' na hora de beber."

Festa e gastronomia

Se antes as festas eram o centro das atenções em Berlim, agora o foco parece ter se deslocado para a gastronomia. "Em se tratando de vida noturna, sempre houve muita inovação na cidade. Mas as locomotivas da inovação estão ficando velhas, e as pessoas e vêm dando mais importância à comida", avalia Gutowski.

Um excelente exemplo disso é o Neue Heimat Berlin Village Market, em Friedrichshain. Os proprietários, que por quase dez anos dirigiram um popular clube techno, o Bar 25, voltaram agora sua atenção para a gastronomia. Eles organizam um mercado de rua semanal, combinando barracas com comidas típicas de diferentes países, concepções criativas e eventos de arte e música.

De diversas formas, esses happenings gastronômicos também atendem ao gosto das hordas de jovens que ainda procuram a capital por sua notória vida noturna. "Esses eventos têm um aspecto comunitário. Numa cidade como Berlim, é mais importante para as pessoas terem a sensação de estar num lugar com gente com a mesma cabeça que elas", observa Gutowski.

Street Food Thursday in der Markthalle Neun in Kreuzberg
Street Food Thursday é um dos muitos mercados de rua gastronômicosFoto: Sean Gallup/Getty Images

Mercados de rua e Berlin Food Week

O Village Market é apenas uma das numerosas feiras culinárias surgidas na metrópole, nos últimos anos. A anglo-indiana Kavita Meelu procurava em Berlim a mesma criatividade da cena gastronômica que conhecia de Londres. Assim, ajudou a criar o evento semanal Street Food Thursday, no mercado coberto Markthalle Neun, onde cidadãos estrangeiros e cozinheiros empreendedores têm espaço para apresentar sua cozinha e sua criatividade.

Pouco tempo depois da inauguração do Street Food Thursday, em 2012, foi lançado um outro mercado de rua gastronômico, o Bite Club, que conta também com DJs e coquetéis. A localização, à margem do Rio Spree, perto do clube Arena, reforça a atmosfera de festa.

Outra amostra da nova onda na cidade é a Berlin Food Week. Inaugurada em outubro de 2014, ela traz demonstrações culinárias, palestras sobre alimentos, jantares e um brunch servido no mercado Bite Club.

Segundo um de seus fundadores, Alexander van Hessen, o objetivo da Semana é lançar a cena gastronômica da capital em escala global. "O mundo ainda não conhece a variedade da cozinha berlinense. O potencial existe, e nós estamos trabalhando para torná-la conhecida", promete.

Novo encanto do regional e tradicional

Em diversos aspectos, os mercados de rua gastronômicos que estão dominando Berlim são simplesmente imitações de feiras como a nova-iorquina Smorgasburg, um encontro de produtores de alimentos que acontece todo fim de semana no Brooklyn. Mas Berlim também está começando a definir suas próprias tendências.

Enquanto alguns empreendedores têm uma orientação decididamente internacional, outros olham "para dentro", aproveitando a onda de interesse na produção artesanal e tradicional e nos produtos de fabricação alemã.

Por toda a cidade se encontram lojas de alimentos regionais, como a Fritz Blomeyer, só com queijos alemães, ou a Culinary Misfits, que vende produtos "de segunda", ou seja, legumes e frutas malformados ou pouco atraentes, de agricultores orgânicos regionais.

Berlin Food Week EINSCHRÄNKUNG
Berlin Food Week inclui palestras, jantares e demonstrações culináriasFoto: Ralph Bergmann

Todo esse enfoque nos locais se manifestou no início de outubro no Stadt Land Food, um festival de quatro dias de degustações, palestras, demonstrações de culinária e jantares, sempre em torno da agricultura e comida artesanais, no Markthalle Neun do bairro de Kreuzberg.

As multidões espalhadas pelas ruas tiveram a chance de provar de tudo: de salsichas e queijos locais a café recém-torrado e cerveja artesanal fabricada em Berlim. O festival incluiu, ainda, o primeiro prêmio anual Berlin Street Food Awards, além de filmes sobre comida e workshops ensinando a fazer queijos e pães.

E o interesse pela cozinha regional não é tudo: também cresce em Berlim a apreciação pelas tradições culinárias. "Cada vez mais se veem os fabricantes usarem receitas, nomes e ingredientes tradicionais. Dez anos atrás, ninguém faria isso, ninguém acharia que é bom [para os negócios]", observa Jörn Gutowski, que recentemente fez uma pesquisa sobre a gastronomia berlinense. As informações foram publicadas no livreto que acompanhou a degustação da Try Foods na Berlin Food Week.

Street Food Thursday in der Markthalle Neun in Kreuzberg
Nas feiras culinárias berlinenses, visitantes provam receitas tradicionais e contemporâneasFoto: Sean Gallup/Getty Images

Tesouros escondidos

Embora muitos concordem que Berlim ganhou grande impulso, ela ainda está correndo atrás de outras metrópoles, no tocante à comida. E, como não dispõe de uma grande população abastada, disposta a gastar fortunas em refeições requintadas, como acontece em outras cidades cosmopolitas, ela deverá continuar assim. E ir desenvolvendo sua gastronomia menos sofisticada – "porém sexy" – por um bom tempo.

Como observa Gutowski, a cena gastronômica em Berlim reflete sua paisagem urbana. Pois a capital alemã não tem o skylinemarcante de Nova York, nem é fácil se apontarem meia dúzia de restaurantes realmente de ponta.

"Para apreciar Berlim de verdade, é preciso explorar os pátios internos dos edifícios, passar algum tempo na cidade. É o mesmo com a cena gastronômica: há um monte de destaques e eventos temporários, há muita coisa acontecendo. Mas é preciso ir atrás", aconselha o gastrônomo.