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1º de abril de 1866

Augusto Valente1 de abril de 2015

Em 1º de abril de 1866 nascia um pianista virtuoso, teórico visionário, compositor controverso e figura central no eixo entre o romantismo e o modernismo. O amor por Bach ligou o toscano Busoni desde cedo à Alemanha.

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Ferruccio BusoniFoto: picture-alliance/ dpa

Ferruccio Dante Michelangiolo Benvenuto Busoni nasceu em 1º de abril de 1866 em Empoli, na região italiana de Toscana. Filho de um clarinetista e de uma pianista de origem alemã, ele foi desde cedo incentivado a estudar ambos os instrumentos.

Logo revelou-se menino-prodígio, nada ficando a dever a um Mozart. Já aos 10 anos, conquistara reputação como pianista, compositor e improvisador, e em 1878 regia seu próprio Stabat mater. Aos 15 anos, após uma estada de Ferruccio na Real Academia Filarmônica de Bolonha, sua família mudou-se para Viena, onde ele travou contato com o compositor Johannes Brahms.

Fugindo da severa tutela artística paterna, e seguindo o conselho do colega alemão, Busoni partiu para Leipzig em 1886. Na então meca musical, conviveu com a nata dos compositores, de Gustav Mahler a Piotr Tchaikovsky, Edvard Grieg e o inglês Frederick Delius. Foi nessa época que se intensificou seu interesse pela música de Johann Sebastian Bach.

Redescobrindo o eterno Bach

Do ponto de vista atual, a história da música ocidental parece impensável sem a figura do genial compositor natural da Turíngia. E quase esquecemos que, após a morte em 1750, Bach esteve relegado ao ostracismo. Durante mais de 70 anos, boa parte de seus manuscritos ficou enterrada em porões úmidos ou foi mesmo vendida a peso pelos herdeiros, como papel para embrulhar peixe!

A partir da redescoberta da Paixão segundo São Mateus em 1829, por Felix Mendelssohn, o renascimento bachiano se deu em diversas "camadas". E Ferruccio Busoni contribuiu decisivamente para esse processo, no final do século 19. Não apenas como pianista de sucesso, mas através da atividade de professor, revisor musical e arranjador, tornou o repertório de Bach acessível a um número maior de músicos e, sobretudo, vivo.

Suas transcrições da obra organística do mestre barroco são verdadeiras recriações. Longe de simplesmente transpor as notas de um instrumento para o outro, Busoni empregou todos os recursos do piano – infinitas nuances de toque, combinações dos três pedais – para reproduzir as riquezas tímbricas do órgão.

Uma prova eloquente de qualidade dessas "transmutações" da obra de J.S. Bach: em pleno século 21, sua adaptação pianística da Chacone em ré menor (último movimento da Partita BWV 1004, para violino solo) reconquista lugar de honra no repertório dos maiores concertistas.

Berlim, pátria criativa

Em 1894 Ferruccio Busoni estabeleceu-se definitivamente em Berlim. Excetuados os anos de refúgio em Zurique, durante a Primeira Guerra Mundial, ele residiria, até sua morte, em 27 de julho de 1924, no número 11 da Praça Viktoria Luise.

As atividades de pianista virtuose e pedagogo o levaram aos quatro cantos do mundo – de Viena a Moscou, de Boston a Helsinque –, garantindo-lhe fama e dinheiro. Porém a capital alemã permaneceu sua pátria criativa. Ainda que, segundo o musicólogo Edward Dent, deplorando a limitação e o convencionalismo da cena musical local, e apesar do assédio perpétuo dos críticos alemães, Berlim era o único lugar onde Busoni conseguia realizar seus experimentos.

Por volta do início do século 20, o músico italiano gozava de "uma certa posição de notoriedade, embora não de respeito pleno. Seus seguidores eram poucos, mas apaixonadamente fiéis, e seu número aumentava [...] Em tudo o que empreendia em Berlim, ele podia estar certo de atrair atenção, ainda que hostil. A própria solidez da vida musical alemã lhe oferecia uma oposição digna de ser desafiada", comenta Dent.

É portanto na Alemanha que a maioria das composições busonianas são estreadas. De suas quatro óperas, Die Brautwahl (A noiva sorteada) foi apresentada pela primeira vez em Hamburgo, e Doktor Faust, que deixou inacabada, teve estreia póstuma em Dresden, em 21 de maio 1925. Esta última tem despertado atenção crescente, como prova o sucesso de montagens recentes.

Obra revolucionária

A publicação do Entwurf einer neuen Ästhetik der Tonkunst (Esboço de uma nova estética da arte sonora), pelo editor Carl Schmiedel em Trieste, 1907, representa um marco para a arte de vanguarda.

Em seu escrito visionário, ele faz desfilar um universo hipotético de melodias, harmonias, ritmos, escalas, formas e instrumentos musicais jamais ouvidos ou sequer imaginados. Como um teclado onde a oitava é dividida em 18 ou 36 intervalos (em vez dos usuais 12 semitons!).

Parte dessas visões só se cumpriria várias décadas mais tarde, com o advento da música eletroacústica. Outras possivelmente permanecerão para sempre no fértil campo da utopia.